quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

a carapuça serviu, mas eu não queria ser uma idiota

éramos quatro. depois de duas horas de massagem, presente de uma amiga, fomos a um bar adorável bebericar. duas mulheres solteiras, duas mulheres casadas, mas daquelas que vivem casamentos civilizados, em que maridos e mulheres podem se divertir num sábado à noite sem um estar com o outro necessariamente.
e então uma das mulheres solteiras contou como tinha conhecido um homem interessante, mas que não era um 'homem para namorar e casar'. isso porque ele não pegou na mão dela: para ele, segundo ela contou, pegar na mão não era nada. ele queria ir para a cama com ela.
e ela estava furiosa com isso. e passou um tempo dizendo como o cara era um imbecil, um tosco, afinal, ela queria um cara para ter 'um compromisso', e não só para dar risadas num bar.
e então uma das casadas da nossa mesa deu um suspiro e depois uma risada: disse que estava casada havia 11 anos, e que acharia ótimo ser solteira e ser cortejada. para ela, a nossa amiga solteira estava, digamos, reclamando de boca cheia.
...
estávamos na minha casa comemorando a gravidez. eu mais duas amigas de infância. uma alegria. comemos e bebemos e conversamos. e então, cada uma jogada numa poltrona, ficamos falando da vida, dando risada. tínhamos tempo e nenhum filho ou marido para nos tirar dali. e então ela diz que toda noite, quando deita na cama, pensa nas coisas que poderia ter feito mas que não fez. e nos diz que isso era muito aflitivo para ela. eu não acreditava no que estava ouvindo, e tive de fazer a defesa dela para ela mesma: o que mais ela queria fazer durante o dia além de trabalhar bravamente, ganhar bem por isso, cuidar dos filhos, dar conta da casa, ir à academia e ainda encontrar tempo para ir ao cinema ou jantar com o marido?
ela faz malabarismos todos os dias, e a única pessoa que não enxerga isso é ela.
...
depois de 17 longos e belos dias, meus filhos voltaram das férias com a família do pai deles. eu havia ficado quatro semanas com eles, e adorei as minhas férias de mãe. dormi muito, acordei tarde, tomei café com um amigo querido, fui jantar na casa de muitos amigos, tomei cerveja com pessoas que não encontrava tinha anos, comi pouco, dei muita risada e, o mais importante de tudo, vivi bem devagar.
estava morrendo de saudades do cheiro dos meus filhos quando, um dia antes do combinado, eles voltaram da praia. eu combinei comigo mesma que podia continuar vivendo devagar.
a casa quieta e muito arrumada virou uma casa alegre e cheia de coisas espalhadas. assim funciona a vida com crianças. e minhas noites de 12 horas de sono ininterrupto viraram noites praticamente insones. tosse, chamados e minha saudade, que me deixava inquieta na cama.
e antes que o primeiro ataque violento de mau humor tomasse conta de mim e permitisse que eu virasse uma bruxa e gritasse com meus filhos, me lembrei que estava com muita saudade, que meus 17 dias foram ótimos mas muito organizados, que eu adoro ser mãe e que a paciência é um músculo e que, por isso, deve ser exercitado diariamente para continuar forte e flexível.
...
tudo isso me faz lembrar uma frase que eu adorava na minha adolescência, e que eu repeti à exaustão. e que, passadas mais de duas décadas, ainda fazem muito sentido, apesar do apelo 'século passado': disse o john lennon que 'nenhum lugar fará você sentir um homem. eu estive em todos os lugares e só me encontrei em mim mesmo'.
e enquanto essa frase for só uma frase para mim, vou continuar reclamando do que está acontecendo e vou ter muitos projetos idiotas para o futuro. ou, como disse barão de itararé, um conterrâneo meu, mas não contemporâneo, porque ele morreu no ano em que nasci: 'as crianças dizem o que fazem; os velhos, o que fizeram; os idiotas, o que vão fazer'. a carapuça serviu.