quinta-feira, 18 de junho de 2009

o lado B - parte II

o lado bom de um dia pós encontro com amigas regado a vinho é que eu fico lenta. não é uma escolha, é compulsório. e eu só me dei conta do lado bom quando me sentei na mesa de jantar e joguei uma partida de canastra com o meu filho no final da tarde. ele de pijama, feliz, organizou as cartas, que nos 'esperavam' desde às 6h30 da manhã, quando ele distribuiu as cartas sobre uma poltrona e disse 'mãe, diz pra nalva não tirar as cartas daqui'. ele ganhou, e foi dormir mais feliz ainda.
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eu nunca consegui aproveitar feliz nenhuma época de desemprego como aproveito meus dias agora. primeiro, porque a culpa que me massacrava já não comparece 24 horas por dia. segundo, porque passei a aceitar que há épocas de muito trabalho, épocas de pouco trabalho e épocas sem trabalho. terceiro, porque parei de fazer listas de desejos de coisas que eu queria que acontecessem e passei a prestar mais atenção às coisas que ESTÃO acontecendo.
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hoje levei o joão gabriel e a lívia à casa da helena, que fez 7 anos. eles saíram da escola e foram direto pra casa dela. o joão dizia que não queria ir. e quando estacionei o carro, ele disse 'vou ficar aqui'. disse que era proibido crianças ficar no carro sozinhas na rua, e ele entrou comigo e com a lívia. o joão comeu cookies com nacos de chocolate e quando vi ele já corria de um lado pro outro. a lívia ganhou pãezinhos com manteiga e um copinho com milho e se sentou feito uma princesa num canto do jardim, sozinha. eu comi cachorros-quentes maravilhosos e fui embora, porque era uma festa de crianças sem adultos. quando fui buscá-los, eles brincavam e eu estava empapuçada com a minha larica descontrol. e eu fiquei pensando em como é bom criar filhos que acham legal ficar numa festa na casa de uma amiga sem a mãe (deles, é claro).
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há quatro dias meu filho foi a outra festa. crianças vão a mutias festas, é surreal. nesta, uma van levaria os convidados, de 7 anos, para o bufê, e cada pai resgataria seu herdeiro no final da tarde.
eis que quando chego na escola, de manhã cedo, vejo a paula dizendo ao pai do aniversariante que sim, os filhos dela iriam à festa. e ela também. e então ela completou: podia ir na van com os filhos? sim, claro.
eu não conseguia parar de rir. porque a paula deve ser a pessoa mais feliz que eu conheço, e ela disse que iria com os filhos na van com uma naturalidade impressionante.
mais tarde fico sabendo que ela não deixa os meninos irem pra uma festa sem ela, ela não consegue. a paula tem sempre um sorriso quando fala, e muitas vezes as frases começam ou terminam - ou os dois juntos - com uma gargalhada sonora. e pra mim não fazia sentido uma pessoa tão feliz não deixar os filhos irem com os amiguinhos para uma festa. mas ela explicava gargalhando que não rolava, o que me deixava quase sem argumentos.
no dia seguinte à essa festa, o luciano, marido dela, explica que a paula e os meninos haviam ido de van porque ELE tinha insistido. aí a história ficou mais engraçada ainda.
eu fiquei um pouco encucada, e peguei a estrada de volta pra casa pensando se eu era uma mãe negligente, que desde o ano passado liberava uma filha com então 3 anos e um filho com 6 para irem em grupo, com os coleguinhas, pra festinhas. mas passou rápido. quem pede pra ir em carros de pais, em vans ou em ônibus são as crianças. e elas vão felicíssimas.
a primeira vez que isso aconteceu, eu fiquei tensa. achava que a lívia era muito pequena. e então ela e o irmão argumentavam que 'não tinha problema'. mas mãe é mãe, e eu fui buscá-los uma hora antes do fim do festerê. a lívia não só não falou comigo como nem olhou pra mim. e eu me senti boba, muito boba, bobíssima.
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por que será que com os filhos a gente tem medo de errar, de ser bundona, de ser dura demais, ou de ser mole demais? as pessoas nunca falam que morrem de medo de trabalhar, ou que ficam assustadas com uma paixão, ou que têm medo de errar com os amigos. mas com filhos a gente abre a boca e fala: e se a escola for ruim? e se eu não estiver cuidando bem deles? e se a empregada não for carinhosa? e se eu me separar, o que será das crianças?
e então eu me lembro da frase do pediatra dos meus filhos, provavelmente dita quando eu só tinha um filho. ele disse que as crianças precisam ser criadas num ambiente de confiança, em que os adultos sabem que as coisas vão dar certo e que passem essa certeza para as crianças. taí a coisa mais difícil de fazer, pra mim, desde que meus filhos nasceram, quando minha vida mudou tanto e ficou mais divertida e mais dura do que eu jamais poderia imaginar.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

o lado B

amanhã, às 6am, quando eu entrar no quarto dos meus filhos, eles não sairão da cama prontamente. passada uma hora e meia da hora da lívia dormir, ela chega na sala e diz 'eu vou dormir no sofá, eu odeio dormir na minha cama'. penso em dizer uma coisa horrível pra ela, que há crianças que não têm nem casa nem cama. respiro fundo e não digo nada. me sentei e comecei a escrever.
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meu filho voltou há pouco de uma festa de aniversário. entrei no bufê para buscá-lo, e o lugar era uma espécie de ginásio, cheio de brinquedos a la parque de diversões. todos desligados, porque era o fim da festa. mas a música era alta, e eu não conseguia chamá-lo sem gritar. no carro ele me disse que tinha música muito alta. agora ele dá socos na mesa de jantar e fala barbaridades impublicáveis.
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eu tenho horror de festas prontas. de festas em que o anfitrião - ou os pais dele - assinam um cheque, e esse é todo o esforço. sem querer desmerecer ninguém. minha barriga dói, e meus filhos andam pela sala.
eu sou uma pessoa antiga, acho. adoro brigadeiros feitos em casa, e não esqueço da festinha do joão em que o bolo de cenoura do parabéns ainda estava quente quando foi cortado. as pessoas falavam oh!!!!! como os americanos falam oh!!!! quando comem um bolo feito em casa - coisa que eles devem fazer no máximo uma vez por ano, pelos ohs!!!!! que falam ao provar homemade food.
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ele disse 'você está bem', e eu concordei. mas lembrei do cansaço que senti quando estava com as crianças no sítio de uns amigos e meu filho estava indócil. assim como o bernardo, filho da minha amiga que me convidou para o ir ao sítio.
eu nunca achei legal criar filhos sozinha, e continuo não achando. acho que é um descompasso, um acidente de percurso que deus não deve ter previsto. aí em momentos como este, em que escuto impropérios de um filho, e vejo uma filha andando pela sala, acho um horror ter de dar conta de tudo sozinha. horror é pouco. mas eu vou ser fina.
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minha cunhada achou o máximo quando soube que teria uma filha sozinha. a marcela, a filha mais velha, tinha então 4 anos. e a béti resolveu se separar do marido. um mês depois, descobriu que estava grávida. sem marido, morando a umas 10 horas de carro da família, fazendo plantões em hospitais, ela teve a linda vitória.
eu na época não tinha ideia do que isso significava. nem filhos eu tinha. mas eu achava que ela era a mulher 'revista nova'. linda, gostosa, trabalhadora, sustentava a família e ainda achava isso bom!
numa época ela dizia que nunca mais teria cuecas em casa. e eu dizia que isso era radicalismo e uma grande bobagem. ela gargalhava e insistia nas gavetas sem cuecas.
os anos se passaram e ela se casou com o homem ideal, de acordo com a visão dela e com a visão dele, o novo marido. e de acordo comigo também.
o felipe, um homem descasado e sem filhos por opção, convidou a então namorada E suas duas filhas para morar com ele. reformou o apartamento, e vivem felizes.
quando eles se casaram, a béti trocou de nome. por telefone, me explicou: aos 42 anos, não tinha de provar mais nada pra ninguém, por isso estava trocando de sobrenome.
esse é o conto de fadas da béti. que eu não inventei nem li em nenhum lugar. ele existe.
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eu sonhei com L., como tenho sonhado há tanto tempo. uma fantasia louca de um príncipe encantado que vai me salvar. vai me amar incondicionalmente, vai comprar um sítio comigo e vai achar excelente a ideia de termos um filho. um homem que vai me fazer feliz até o fim da minha vida. e como L. é um homem lindo, bem-sucedido, inteligente e tem um puta senso de humor, nos meus sonhos ele vira o príncipe salvador.
quando acordo, fico aterrorizada. escrevo o sonho, leio e releio o que escrevi, e fico furiosa com uma fantasia tão sem cabimento.
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minha barriga ainda dói. e os selvagens dormiram, cada um com uma bolsa de água quente na barriga.