quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

o grande saco e/ou a viagem na maionese - para ser fina

cheguei um pouco antes da hora marcada. fiquei sentada na nem tão sinistra parte da sala onde os clientes esperam. uns 15 minutos depois aparece um homem solícito, o rogério, e vou até a mesa dele. falamos rapidamente sobre a revisão do carro, e ele pergunta se vou aguardar. sim, digo. demoraria duas horas.
leio o jornal e duas revistas que tinha levado. vou tomar água, leio um pouco sobre 'itens essenciais de um guarda-roupa' de pé, no balcão do café. vou ao banheiro e volto pras cadeiras onde outros clientes também aguardam.
duas horas e meia depois, o rogério me chama e me apresenta um orçamento. fico com a boca aberta, não consigo disfarçar. a revisão, que custaria uns 200 reais, foi pra mais de mil. e então ele explica que aquilo é um orçamento, que o trabalho dos '200 reais' tava pronto, mas o dos '1000 reais' teria de ser agendado. me explica o que precisa ser trocado no meu carro. eu pergunto se posso andar 2000 km com o carro ANTES de fazer as trocas necessárias. ele garante que sim.
pago e fico plantada esperando o rogério aparecer com o meu carro. ele não aparece, peço ajuda à recepcionista e plim, lá vem o meu carro. tchau, obrigada.
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ai ai ai. como é chato cuidar de tudo. do dinheiro, da casa, dos filhos, do carro. entender de filtro de ar do motor e de calota que caiu - não é a da roda, é outra, que cuja existência eu desconhecia.
mas como eu tenho um otimismo que às vezes é insuportável, fiquei pensando na grana que gastei no dia em que fui ao borracheiro e ele disse que os DOIS pneus do meu carro tinham de ser trocados. e cada pneu de um marea turbo custava 600 reais, há alguns anos. respirei aliviada. e tratei de vender o carro logo.
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eu acho uma maravilha ser dona de uma furadeira bosch, presente de dia das mães do meu ex-marido quando ele ainda era meu marido. ele não gostava de fazer furos na parede. também acho ótimo cuidar da minha vida sem ninguém dar pitaco. e adoro morar com os meus filhos numa casa colorida e linda, e ter na agenda o telefone do encanador e do marceneiro. mas vamos combinar que tem horas em que resolver tudo sozinha é um saco, um saco gigantesco.
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há muitos anos, eu aluguei uma casa no embu, e tinha de pegar a estrada para ir pro trabalho, no centro de são paulo. namorava um homem adorável, cuja mãe ficou passada quando soube para onde eu estava me mudando. 'e se acontecer alguma coisa na estrada, se o pneu furar à noite, como você vai fazer?'. eu nunca tinha pensado nisso. mas o pneu nunca furou e foram poucos e felizes os meses em que morei numa casa linda, cheia de verde ao redor.
como as rugas não são em vão, passada mais de uma década do comentário da anita, que na época eu achei sinistro, eu fico pensando o que me deu na cabeça para resolver ir ao casamento de um primo na praia do rosa, em santa catarina, de carro, com os meus filhos. e se acontecer alguma coisa na estrada? e se eu não aguentar dirigir os 800 km sozinha? e então sinto uma tristeza. que vem misturada com um pouco de medo. e com a coragem que me faz ter certeza de que tenho de fazer essa viagem.
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toda vez que meus olhos enxergam dureza na vida eu sei que estou desconcentrada. é muito fácil sentir que os dias são um redemoinho. sentir que estou pisando em ovos - crus, evidentemente - e que a qualquer momento posso tropeçar e cair de bunda na meleca. mas é necessário um esforço hercúleo para fazer a minha cabeça lembrar que os tempos duros passam, assim como os dias felizes. e que é preciso viver um dia depois do outro com a mesma tranquilidade que sinto quando acordo na praia e vou tomar um banho de mar.
mas a lucidez dói, e enxergar a vida com clareza dói também. porque aí não tem nenhum redemoinho e meus olhos veem o que tem de ser visto. é tão simples que parece ridículo. mas não é. afinal, ensinam pra gente que a vida é bela mas esquecem de ensinar que a vida também pode ser feia. de novo, tão simples.
mas é só assim que a gente consegue escolher o caminho certo. felizmente, não há manual de instruções. é preciso experimentar pra ver se é o que a gente quer. assim como casar. e como ter filhos. e assim como tudo na vida. se não experimentar, não dá pra saber o gosto que tem.
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vai ver que é por isso que uma amiga me chama de pati maionese. diz ela que eu sou parecida com o personagem, que eu não conheço. mas vai ver que é porque eu viajo na maionese. meu deus!

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

finalmente, o ano começou

o despertador tocou às 5:15am. eu saí da cama animadíssima. para quem tem herdeiros em idade escolar e que dependem de alguém que os leva à escola, a volta às aulas é sinônimo de início de ano.
estava escuro, como sempre é nesse horário. mas como a janela da cozinha é enorme, eu vejo o céu escuro e vejo também o dia nascendo. o horário mais glorioso de todos.
este ano vai ser diferente. e eu estou com medo.
levar e buscar os filhos todos os dias da escola é o plano A. o plano B é levá-los e buscá-los da escola todos os dias. e o plano C é idêntico aos planos A e B.
e para sair de casa à noite sem estar acompanhada dos meus pequenos herdeiros eu terei de subornar a doce nalva. até então, nos últimos quatro anos, meus filhos dormiam uma vez por semana na casa do pai deles - primeiro na casa da noiva do pai, onde ele morava, depois na casa da namorada do pai, que virou a mulher do pai deles. mas eles têm outros planos para este ano, e a ida à casa do pai durante a semana não existe mais.
eu tenho a sorte de ter amigos adoráveis. tão adoráveis que cuidam e amam meus filhos de uma maneira surpreendente e inacreditável para quem não é nem parente. isso é um alívio para o coração, pelo menos.
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eu contei a ela que tinha passado umas semanas na praia com as crianças durante as férias delas, e que depois tinha ficado quase 20 dias sozinha em são paulo, quando as crianças viajaram com o pai delas. e ela disse 'nossa, que tédio'. o quêêê? disse a ela que o tédio não tinha me visitado. e que com os meus dias sem horários, sem obrigações e sem nenhum 'manhêêê' eu consegui me divertir, visitar muitos amigos, passear, viajar, dormir. ao que ela respondeu: 'eu não consigo ficar sem a minha filha'. é engraçado como algumas pessoas conseguem casar com os próprios filhos que têm. grudam neles como grudam nos seus maridos ou mulheres. ninguém pode ir até a esquina sozinho porque a esquina é muito longe do alcance dos olhos. eu tento não encarcerar ninguém que eu amo. é um esforço diário, que pelo que me lembro começou quando nasci. nunca acreditei nisso, desde pequena. não gosto de gaiolas, de grades, de carros blindados nem de ciúmes.
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ele disse que eu sou 'foderosa'. ela disse 'então você é guerreira'. é engraçado como as pessoas veem coisas na gente para as quais estamos cegos. hoje vi um filme belíssimo - será que é isso mesmo ou meu cérebro também engordou nas férias e está lesado? - e fiquei surpresa. meus filhos assistem a muita coisa que eu considero lixo e que eles amam. mas mulan II - 'em números romanos', disse o joão gabriel - fala das escolhas do coração. as imagens são surpreendentes, e o texto é maravilhoso, um escândalo, se eu considerar o tanto de filmes-lixo que são produzidos 'para crianças'.
mas voltando à minha cegueira em relação aos comentários que escutei: se eu tivesse que escolher de novo o que escolhi na minha vida, eu faria exatamente as escolhas que fiz. meu adorável sogro clemente dizia isso, e por isso eu acho que ele morreu feliz. ele dizia que fez tudo o que queria ter feito na vida dele.
e penso nas minhas escolhas mais recentes. morar sozinha com os meus filhos, comprar um apartamento em são paulo quando estava muito dura, sair de um trabalho assustador. na hora da decisão, a gente nunca sabe o que virá. mas eu sempre soube que estava escolhendo o que era viável para o meu coração. o resto é detalhe, é pouco, é bullshit.
mas o resto pode ser ficar dura. morrer de medo. e ter a sensação de que não vou dar conta. sentir falta de ar. e chorar.
mas é também deitar a cabeça no travesseiro e dormir longas horas de um sono bom. ter sonhos doces. e ver meus filhos crescendo fortes, alegres. ver meu filho fazer a lição e escrever letrinhas com cuidado no caderno. e ouvir minha filha perguntar: 'já é 1h?', e eu responder 'a 1h da madrugada já passou, mas a 1h da tarde ainda não chegou'. e ouvir a resposta: 'mas mãe, a 1h é a primeira hora das horas são, né?'.
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deus esteja.