sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

aqui no forno alegre os termômetros marcam 36 graus

me lembrei feliz que estava de férias - nada como ser uma desempregada que rebola pra ver o lado bom das coisas - quando não sabia em que dia da semana eu tinha acordado. isso são férias de verdade.
mas há outros bons sinais disso. disso, no caso, de que estou de férias: a manicure é uma visão distante, meus olhos estão ardendo porque estou há uma hora em frente ao computador, acordo quatro horas mais tarde do que o horário que costumo acordar e passo o dia todo de biquini e havaianas.
na verdade, achei que TINHA de escrever aqui hoje, porque daqui a dois dias estarei nos cafundós do judas, se é assim que se diz quando se vai pra um lugar tão docemente ermo que não há internet. só meu celular, que eventualmente não terá sinal. mas em compensação conviverei com mosquitos grandes e gordos, daqueles bem famintos, e se chover, escutarei a sinfonia melancólica e bela dos sapos.
é engraçado saber que existem outros modos de viver além do que a gente está acostumado. é uma dor e uma delícia ao mesmo tempo.
eu, que achava que já tinha atingido o estágio das pessoas sem graça que sempre acham que a água da piscina é fria demais, tenho passado parte das manhãs e das tardes dentro da água gelada. sinal de que não estou tão velha como vinha achando. ah ah ah.
e eu, que sempre digo que não entendo nada de fazer comidas, só de descobrir receitas, passei a véspera do natal dentro da cozinha da casa dos velhos, preparando com afinco uma ceia maravilhosa. as pernas estão doloridas hoje, mas é falta de costume: raramente passo horas de pé de um lado para o outro dentro de uma cozinha. raramente não: quase nunca.
agora vou-me. dormir horas e horas para descansar e sonhar os sonhos que tenho de sonhar para achar o rumo. e para lembrar de umas verdades que por vezes se escondem tão bem de mim que eu não só não as encontro como esqueço que elas existem. e para ter forças - e lucidez, oh my god! - para viver bem devagarinho, como manda a alta temperatura aqui no forno alegre.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

siamo arrivati a porto alegre

o céu escandalosamente azul nos deu as boas vindas. as férias começaram, oficialmente. e por um milagre da natureza, não estamos morrendo de calor.
entro na casa dos velhos e logo uma moça sorridente me pergunta se quero ajuda. é o sistema de qualidade dessas terras do sul: a nova empregada da minha mãe, que acaba de começar a trabalhar na casa dela mas que já disse que vai embora semana que vem, é solícita.
jane - este é o seu nome - fez uma comida deliciosa. depois, as crianças se joam na piscina gelada. eu quero arrumar a bagagem, e ela pergunta se quero ajuda. digo que é só prestar atenção ao movimento na piscina. e entõ escuto ela conversando com a minha filha, que ainda usa boias mas estava felicíssima na piscina onde os pés dela tocam o fundo. escuto as gargalhadas da lívia e a voz da jane, que conversa lindamente com ela.
mais tarde saio a pé, e quando estou voltando pra casa vejo uma mulher andando na calçada, na direção oposta à minha. ela fala ao celular, e quando chega perto de mim, diz ao interlocutor para aguardar. reconheço a jane. ela me dá dois beijinhos de tchau e diz 'fala pra tua mãe que eu passei toda a roupa. tchau, patricia'.
eu já queria levar essa pessoa pra minha casa. aliás, toda vez que venho pra essas terras do sul fico com vontade de levar muita coisa pra minha casa: essas pessoas daqui, que olham no olho da gente quando dizem oi, o céu azul que me deixa boquiaberta, e o jeito mais calmo que os gaúchos vivem os dias. e queria também as calçadas largas, limpas e sem buracos, e a cantoria dos passarinhos, que também me parece mais calma.
minha filha sai da cama e pede que eu 'vaia' ficar com ela. digo que já vou, pra ela esperar um pouquinho. 'não quero esperar. quero que você vaia agora'. lá vou eu.

domingo, 13 de dezembro de 2009

o natal e as crianças

"Sempre esperamos milagres, porque eles se realizam!!! E porque nós não precisamos de mais 'coisas'; desejamos mais significados, propósitos e espírito no que vivemos."
...
último dia de aula das crianças. saímos de carro, à tarde, para pegarmos filmes na locadora. 'você tá há dias prometendo', andava dizendo meu filho. um trânsito surreal, desvio o caminho, e ele me diz que 'as pessoas estão enlouquecidas fazendo compras, a luli me disse'. a luli é a motorista das crianças.
e eu, que mesmo tendo gastado pouquíssimo para as compras deste natal me acho uma consumista boba, explico pros meus filhos que o natal é uma época em que devemos pensar nas coisas de dentro, não nas coisas de fora. mas vamos nos perdendo e comprando e comprando.
o joão gabriel faz uma defesa fervorosa da data, dizendo que é justamente nesta época em que eles ganham chocolates deliciosos - aqui em casa cada criança ganha um chocolatinho daqueles de pendurar em árvore por dia, até o dia do natal. nisso a lívia solta a pérola: 'se tesse só frutas, não ia ter graça'.
...
disse pra eles que no ano que vem eu vou FAZER todos os presentes. eles acharam a coisa mais sem graça do mundo. até porque já ganharam de natal um jogo da velha de feltro maravilhoso feito por mim, uma boneca de crochê que eu fiz - a única coisa de crochê que fiz na vida depois das 'correntinhas' que fazia com a vó maria, que não era minha vó, mas tia da minha mãe, e cuidou de mim e dos meus irmãos quando meus pais foram viajar pela primeira vez pra europa e deixaram os filhos em porto alegre.
...
leio matérias ridículas sobre 'natal sustentável', contando histórias de pessoas que fazem biscoitos e outros presentes. eu faço biscoitos de natal com os meus filhos há alguns anos, e nunca pensei que isso era uma forma de natal sustentável. pra mim isso é uma forma de natal.
...
pra celebrar a data, convidei algumas amigas para jantar na minha casa. aparentemente quase nenhuma poderia vir, e eis que aos 45 min do segundo tempo chegam todas, menos a marcia, que trablaha na globo e claro, tem a agenda lotada. diferentemente da minha, que agora é super livre. algumas amigas minhas não se conheciam, e eu ia apresentando cada uma de acordo com os anos que nos conhecíamos. foi maravilhosos ver juntas mulheres de 28 a 50 anos tomando vinho e comendo comidinhas deliciosas, todas feitas por mãos femininas e dedicadas - eu não cozinhei nada, mas preparei tudo. eh eh eh.
...
uma jornalista que trabalha no desenvolvimento de uma ferramenta para empresas acompanharem o que saiu na mídia sobre elas, uma psicanalista, uma jornalista que toda vida trabalhou numa grande editora e agora trabalha em casa e mui feliz, uma ex-jornalista que virou arquiteta da informação, uma publicitária que atualmente é mãe full time (existe mãe que não o é full time?), uma obstetra, uma anestesista e uma jornalista free lance. e eu, jornalista desempregada.
...
moças sem filhos, com filhos pequenos, com filhas adultas, tentando engravidar e nem pensando nisso.
...
variety is the spice of life, estava escrito numa camiseta linda que eu comprei há uma década numa livraria na itália,. segundo o daniel piza, a frase é de shakespeare. que seja. mas é fato.
...
depois desse jantar alegríssimo, em que comemos e bebemos e falamos barbaridades, fiquei pensando que os meus presentes de natal eu já estava ganhando, antes da noite do dia 24, para escândalo dos mais ortodoxos. eu ficava muito brava quando era pequena e minha mãe achava que qualquer coisa que fosse comprada perto do natal era um presente de natal e só deveria ser aberto no dia 24.
...
já ganhei tantos presentes neste mês que nem preciso abrir nenhum pacotinho na noite do dia 24.
...
ontem fui convidada pra tomar um mate na casa da minha comadre. eu acreditei, levei um mate, e que mate que nada! cerveja uruguaia e uma mesa tomada de delícias. crianças brincavam alegremente, e adultos conversavam e comiam e bebiam dando risadas. quando fomos embora, minha filha sorria na cadeirinha do carro. e meu filho, que é tão branco como eu, tinha o rosto vermelho como eu nunca tinha visto. de tanto correr, brincar e dar risada.
...
esta semana mais encontros com pessoas que fazem muito sentido para mim. despedidas do ano mais duro de todos. e sei que tenho de me despedir em grande estilo, porque o ano que vai começar será novo de verdade.
...
acho brega repensar a vida em dezembro, considerando que há 12 meses no ano. mas aconteceu. foi uma coincidência. meu limite de dor chegou, e eu tive de parar. e agora repenso, e não quero repetir coisas que já fiz.
...
hoje é domingo, tá frio e chove. não saímos de casa. alegria total. a cozinha está intransitável, e eu estou me preparando espiritualmente para limpar a bagunça. o vinho está maravilhoso, e as crianças devoram pipoca e assistem um dvd do tom e jerry emprestado pela minha comadre. estamos todos felizes com as férias.
...
semana passada a doce nalva adoeceu e não pisou na minha casa por dois dias. foi o nirvana, mas o nirvana com cheiro de pó. porque minha mania por limpeza não é grande a ponto de me fazer pegar um balde e passar pano pela casa. graças a deus. e eu pensei, nesses dias de lavar louça-arrumar camas-colocar roupas na máquina-recolher lixo-varrer a cozinha e tal que é bom criar filhos que saibam viver sem serviçais. os meus, com 4 e 7 anos, sabem um pouco. fazem camas, dobram roupas, tiram a mesa, lavam louça. hoje tentei ensiná-los a fazer bifes, mas não se animaram. mas meu sonho de consumo é fazer minha casa funcionar só com a gente. empregada só pro luxo do luxo, como um jantar com quiche e salada de folhas com molho de manjericão fresco.
...
e sobre a frase lá de cima, de que não precisamos de mais 'coisas', isso é que vai nortear nossa vida no próximo ano. mamãe não vai comprar uma land rover, nem um sítio. não vai sonhar com sandálias prada nem com finais de semana em paris. o que vier é lucro. mas vamos querer mais domingos chuvosos em casa com bom vinho, mais encontros com amigos, mais cafunés na cama de manhã cedo, em dias que não tivermos de sair de casa às 6h30. mais conversas todos os dias, mais abraços e mais declarações de amor. mais telefonemas pro meu irmão, que mora do outro lado do mar, e mais atenção pra olhar os passarinhos que passeiam na nossa janela e que cantam muito de manhã e de noite.
...
mas se a mamãe não quer comprar uma land rover, ela quer tomar mais banhos de mar. pra isso talvez tenhamos de mudar algumas coisas. mas se os sonhos trazem mares com ondas maravilhosas, posso trazer isso pra minha vida, non?
...
eles irão pra cama muito cedo hoje. e eu também. pra que os sonhos tenham tempo suficiente para aparecerem enquanto durmo.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

magros, alegres, felizes

os nossos pais tinham razão, e uma citação bíblica, um pouco mais antiga, também. 'diga-me com quem andas e dir-te-ei quem és'. ou será que isso não vem da bíblia? eu não vou checar, mas acho que vem sim.
ora pois. eis que dois cientistas da terra do tio sam tocam um estudo que diz que a obesidade é contagiosa. assim como é contagiosa a felicidade, o hábito de fumar, a solidão. é surpreendente: um amigo obeso aumenta as suas chances de ficar um gordo em 57%. oh my god.
isso tudo eu descobri na edição de domingo (6/12) do caderno mais!, da folha de s. paulo. e então eu fiz uma lista de resoluções importantíssima para seguir ano que vem:
- vou ser mais amiga da paula c., que está sempre, mas sempre rindo. na verdade ela não ri, mas gargalha. assim, mesmo nos dias mais cinzas, vou enxergar colorido
- telefonarei mais vezes pra paula a., pra convidá-la para tomar vinho na minha casa. a paula é médica, trabalha muito, faz plantões de 24 horas, e sempre me diz que tudo está ou vai ficar bem. e encontrando com ela mais vezes, vou acreditar que sim, as cousas dão certo
- convidarei para um chopp a daniela z., que eu conheço tão pouco. ela é um escândalo: elegante, simpática, querida e blasè. lições importantíssimas. e assim vou aprender a ser blasè e deixar de lado meu lado 'ui, espanei'
- marcarei programas com a vânia c., que é incrivelmente íntegra. toda vez que a vi, ela estava 100% presente. tá ali com tudo, não deixa nenhum pedaço perdido. e vou aprender a sempre andar comigo inteira, nunca esquecendo um pedaço nalgum lugar
- vou tentar encontrar muito mais vezes a flávia r., que sempre diz tudo o que pensa sem ser deselegante. mesmo quando surta, ela sabe que está surtando e avisa. e mesmo assim consegue ser elegante, inteligente e muito, mas muito divertida. e com ela vou aprender a dizer verdades de forma mais divertida
- continuarei a encontrar o roberto c., que sempre ilumina os momentos mais sombrios e me ajuda a enxergar as minhas sombras. para que eu possa andar sem encontrar tantas pedras no caminho
- tentarei encontrar mais vezes o sérgio s., que diz que eu sou a mãe mais judia que existe, apesar de eu não ser judia. ele diz que eu não entro na lista de mães loucas e descontrol. assim vou conseguir educar meus filhos com mais certezas do que dúvidas
- e vou tomar muitos chopps e vinho com a rachel b., pra saber que sentar com um amigo e conversar sobre a vida tem um valor que nenhum cartão american express gold paga
...
mas tem a outra lista, que na verdade é uma frase. vou riscar da minha agenda as pessoas que bufam sem parar, as que dizem que a vida é chata, as que reclamam sem parar, as que acham que dever pro banco é o fim do mundo e as que não acreditam que a vida dá muitas voltas e que tudo, tudo mesmo, passa. mas preciso muito conviver com as pessoas citadas acima pra não riscar o meu própio nome da minha agenda!
...
e para inspirar os dias loucos de dezembro, drummond:
"Para ganhar um Ano Novo que mereça esse nome, você, meu caro, tem que merecê-lo.
Tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil, mas tente, experimente consciente.
É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre."
...
coraggio, como diz o pai da danic.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

a vida é bela, mas dura. ou...


a rapadura é doce, mas não é mole não.
...
ela me conta que agora está trabalhando mais. com três filhas, de 7, 6 e 5 anos, ela alugou uma sala no centro de são paulo para ser o escritório. trabalhava em casa, mas só conseguia produzir de manhã, quando as meninas estavam na escola. agora, vai pra são paulo todos os dias, metade do caminho de carro, a outra metade de ônibus. o que dá 1h e 30min na ida e 1h e 30min na volta. pergunto se ela não pensa em morar em são paulo. ela diz que não. 'estou feliz'.
...
depois de uma longa conversa no telefone, desligo e venho escrever. minha amiga de muitos anos tem medo de dizer um trilhão de coisas para o namorado. um homem mais velho que ela, querido, gentil, bem sucedido e misterioso. e, aparentemente, mentiroso. ela bufa no telefone e diz que as coisas estão enroladas. e eu digo pra ela que as coisas - a história deles - sempre foi enrolada, e que é hora de desenrolar. as verdades são mais doídas do que as mentiras. e ela jurou que vai ser uma mulher de verdade, e não uma mulherzinha, e que vai falar as coisas do coração dela pra ele.
...
festinha no sítio. os pais da aniversariante me dizem que é fácil de chegar. que o lugar é maravilhoso, e que a vida deles mudou muito desde que deixaram são paulo para viver no sítio. eu fui levar os meus filhos, toda feliz, mas sentindo um pouco de desconforto. que surpresa encontrar mães e pais que acham absolutamente normal se tocar pra um sítio ao meio-dia de uma sexta-feira. quem não podia levar o próprio filho não levava, porque o esquema de caronas é mui eficiente. uns levaram, outros buscaram, e teve os que levaram e trouxeram de volta. pessoas maravilhosas, dispostas, que em nenhum momento falaram 'nossa como é longe!'. só eu, que fiquei na estrada por 1h e 30min até chegar em casa. e ainda errei o caminho e não deixei a menina que vinha de carona comigo onde havia combinado com a mãe dela. liguei, parada no trânsito, e disse que o trânsito parado me impedia de deixá-la onde havíamos combinado. eu não aguento.
...
'eu não sou uma pessoa confiável'. ela diz isso depois de me dizer que não bebe. ela não dá conta. diz que se beber vai enlouquecer. pergunto se o marido dela bebe, e ao ouvir a resposta afirmativa, sugiro que ela comece a treinar em casa, com o marido. e digo que normalmente as pessoas que não bebem são bem mais confiáveis do que os que bebem. não é óbvio?
...
a menina senta ao meu lado, na escada de pedra. 'essa casa é fantástica', me diz, quase sussurrando. pergunto por que, e ela aponta pra casa de boneca - dessas que cabem várias crianças dentro, com belas janelas e uma porta de madeira -, e diz que ela ganharia uma casa de boneca, mas aí o pai resolveu se separar de mãe, vendeu o terreno e ela nunca vai ter nem a casinha nem o cachorro. minha interlocutora tem 7 anos. o que é inacreditável. digo a ela que os planos na vida nem sempre dão certo, mas aí surgem novos planos. será que ninguém nunca falou isso pra ela?
...
férias da família, férias da empregada, matrícula da escola, iptu, licenciamento do carro, seguro do carro, presentes singelos para o natal. será que tem alguma conta a pagar entre dezembro e janeiro que eu esqueci?
...
a vida é bela. mas por que é tão dura?
...
escuto a risada da paula. risadas gargalhadas, as dela. e sim, sei que as cousas não são em vão. e que tenho de acreditar. é pra frente que se anda. punto e basta, como dizia minha professora de italiano.
...
deus esteja.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

o sono, a obra, a granja

há muitos anos ouvi um médico dizer que o ouvido de um pai ou de uma mãe tem de ser treinado. para provar a teoria, ele contou como os médicos dormem durante um plantão mas têm os ouvidos atentos para qualquer chamado no meio da noite, no meio do sono. ouvidos treinados, claro, porque os médicos não nascem assim.
e então o contrário também vale: quando um pai ou uma mãe não estão perto do filho durante a noite, o mesmo ouvido treinado para ouvir chamados, tosses e mesmo a respiração dos filhos consegue não ouvir nada. e assim a noite passa docemente. e assim foi ontem, quando dormi 13 horas.
essas horas todas de sono não foram ininterruptas. porque eu sou vizinha da obrga do metrô. bingo! os rapazes começam no batente cedo, às 7h, ou um pouco antes. e começam a trabalhar animados - eu tenho uma teoria de que o melhor trabalho do mundo é na obra do metrô do consórcio da linha amarela, porque todos os homens que trabalham ali são felizes, cantam durante o trabalho, dão muita risada. e então, nas últimas horas da minha longa noite, marretadas me tiravam do sono por uns minutos. mas depois eu voltava a dormir, o que é outra característica que pai e mãe desenvolvem mui rapidamente quando passam a ter herdeiros.
e eis que hoje minha filha foi brincar na casa de uma amiga. primeiro ela me disse que só iria se fosse depois do almoço. expliquei que a amiga não morava em são paulo, então ou ela ia depois da escola ou não ia. então ela me explicou que iria, mas que só almoçaria se gostasse da comida. ok. e ela foi.
mas alguém tinha de buscá-la. como a santa nalva, que trabalha na minha casa, não sabe dirigir, esse alguém sou eu. e fui, pensando em como pais fazem coisas que provavelmente jamais fariam se não tivessem filhos.
andei uns 20km, e cheguei. minha filha, a amiga e a mãe da garota acenaram de dentro da piscina. não estamos em são paulo, e as piscinas fora de são paulo podem ser vistas da rua.
as meninas teimam em ficar na água, mas acabam saindo. tomam banho, e eu aceito um café. saímos voando, porque tenho 25 minutos para chegar em casa. hoje é meu rodízio, e tenho de estacionar o carro na garagem até as 17h.
o céu preto vira céu cinza, e uma chuva forte deve ter provocado o que vi: estrada parada. minha filha dormiu nos primeiros cinco minutos sentada na cadeirinha, e eu vim respirando fundo e pensando em coisas boas.
uma hora e 20 minutos depois chegamos em casa.
estou feliz de estar em casa. e fico pensando em como a família da donata, amiga da minha filha, é feliz morando lá longe, na granja viana. a mãe dela, a clotilde, me conta que engraviou 'depois de 20 anos casada'. ela tinha 47 anos na época. agora tem 53, e nada na piscina com a filha dela e com a minha numa quinta-feira de dezembro. isso é luxo.
quantos anos terei até ter coragem de morar no meio do mato?
...
frases boas:
ele me conta que ganha muito mais do que consegue gastar. vou perguntar a ele qual a oração que ele reza.
...
ela me diz que gosta de trabalhar, e que adora não trabalhar também. ela tem 25 anos e já sabe disso.
...
'eu não vou à praia', ela me fala pelo telefone. eu tinha ligado pra dizer que passarei não uma, mas quatro semanas com ela e com meu pai. e ela pergunta por que eu não avisei antes. mas eu tinha acabado de remarcar as passagens. mesmo assim acho que as férias das crianças serão ótimas.
...
'eu odeio adivinhar as letras', meu filho diz, bufando, ao fazer lição de casa. ele está sendo alfabetizado, e tinha de escrever dez palavras. há crianças que não começam a ler 'de repente'. começam a ler devagar, e com muito, mas muiiiiiiito esforço.
...
'esse foi o dia mais chato da minha vida'. este é o novo mantra da minha filha, para fechar o dia com chave de ouro. a frase, na verdade, significa 'estou muito cansada e quero dormir'.
...
e uma dúvida: será que vai dar tempo de celebrar a vida neste mês em que todos, absolutamente todos, ficam loucos?

domingo, 29 de novembro de 2009

estamos todos cansados

o ano tá acabando, e estamos todos cansados. mesmo depois de uma noite de 12 horas de sono, as crianças acordam com cara de ressaca. e eu também.
não há nenhum sonho mirabolante para o próximo ano, graças a deus. os cabelos brancos não são em vão. eu não quero emagrecer dez quilos nem começar a correr maratonas. sinto uns frios na barriga, mas só das coisinhas de todos os dias. onde encontrar um trabalho bom? como não comer pão? qual computador é mais eficiente? como fazer meu filho usar o aparelho nos dentes depois do investimento estratosférico?
...
às vezes a gente dá conta da vida e acaba achando tudo tããão banal. a vida segue em preto e branco e em slow motion. chopps em slow motion, conversas com os amigos idem. estou terminando de editar um livro em slow motion, e bebo vinho gelado em slow motion também. é quase uma chatice, não fosse o conforto que essa velocidade lentíssima traz pra mim.
minha pequena casa tá enfeitada. no canto da sala o pinheirinho (porque é pequeno mesmo) tem luzinhas (pequenas também) acesas, e é doce olhar para ele e saber que é época de natal. calendários de advento espalhados pelas paredes também são visões boas. hoje meus filhos e eu cantamos músicas de natal com a primeira vela da coroa de advento acesa. morri de saudades do meu avô, e lembrei de quando cantávamos músicas de natal ao redor da pequena mesa de jogos, num canto da sala gigantesca da mansão onde ele morava. a maioria das músicas em alemão, e eu, meus irmãos e meus primos íamos pela melodia, não pela letra.
semana passada fui à kopenhagen comprar os adoráveis chocolates para pendurar na árvore. e não resisti: disse pra moça que me atendeu que a produção desses chocolates tinha no mínimo 40 anos - essa é a parte que eu conheço, mas os chocolates devem ser mais antigos que isso. ela fez cara de paisagem, e eu vim pra casa feliz da vida carregando aquela sacolinha valiosíssima. o preço desses chocolates em forma de bengalinha, pinheiro, bota, bola é um absurdo. e a alegria de ter esses chocolates na árvore não tem preço. mesmo.
um dia depois, convoquei as crianças pra cozinha: dia de fazer a primeira leva de biscoitos de natal. eles ficaram comigo na cozinha do início ao fim da tarde. quebraram ovos, misturaram a massa com as mãos, abriram a massa com o rolo, cortaram os biscoitos com as forminhas, colocaram os biscoitos na assadeira, jogaram açúcar com canela sobre eles. depois ainda rolou uma operação colocar-os-biscoitos-no-saquinho. e ainda a distribuição para os porteiros zelador e faxineiro do prédio.
nesta semana faremos a segunda rodada.
...
ontem tomamos chá e comemos bolo ao som de um piano. meu filho deve ter algum antepassado nobre, cuja existência desconheço. ele se sentava na mesa do salão de chá e ficava bebericando e comendo bolo. uma hora numa mesa de amigos da professora dele, e depois sozinho, bem feliz. estávamos no bazar de natal da escola dos meus filhos, quando rola também a exposição dos trabalhos em cada classe. a pajelança teve direito a churrasquinho, pizza no forno à lenha, picolés, salada de frutas, sucos, pastéis. e o maravilhoso salão de chá, em que crianças de dez anos, da turma do quarto ano, servem em bandejinhas a bebida e os bolos feitos em casa pelas famílias das crianças pequenas que estão no jardim de infância.
...
mesmo quando é em preto e branco, a vida pode ser muito bela. belíssima. hoje fiquei dando risada com meus amigos enquanto almoçávamos numa varanda enorme, no décimo primeiro andar de um prédio, numa parte muito alta de são paulo. o vento insistente fazia voar os guardanapos, e as crianças tiveram de usar agasalhos. e um céu muito cinza nos brindou. como é bom ter amigos que dão valor para almoços inesquecíveis sob um céu tão lindo.
...
escureceu, e a sala está iluminada só com as luzinhas da árvore. e agora eu vou rezar pra que o pai do céu mande lindas criancinhas pra vida dos meus amigos, que querem tanto ter a imensa casa deles cheia de gente! mal sabem eles que eu ouvi um anjinho sussurrar um segredo no meu ouvido.
deus esteja.

sábado, 14 de novembro de 2009

ficar doente pode?

saí da cama na hora em que o despertador me avisou que eram 5 da manhã.
fui pra cozinha fazer o que sempre faço enquanto o sol vai acordando. esquentar água pro chá, cortar o pão do lanche das crianças, escolher uma fruta pra colocar na lancheira, colocar a mesa pro café da manhã, a refeição mais doce de todas.
eu suava. voltei pro quarto pra colocar um roupão animal que eu tenho desde a época em que nadava barriguda, grávida do meu filho. o roupão, grande e quente, me esquentou. mas eu continuava suando, e sentia gotas escorrendo pelo meu corpo.
café da manhã preparado, lancheiras prontas. tomei banho, o suor parou, e eu fui acordar os pequenos.
comemos bebemos e nos aprontamos.
mas não estou bem. e acho que é frescura.
eles estavam em casa porque o pai não os havia levado para dormir na casa dele. as crianças estavam gripadas e ele, o pai, não queria que a filha pequena dele pegasse a gripe dos irmãos. mas era o dia de ir pra escola com o papai. e ele chega, e os leva.
continuo suando, e penso em não ir trabalhar. mas como não trabalhar? volto pra cama e durmo. com o despertador pra me acordar dali a duas horas, pra eu ligar e avisar que não vou trabalhar.
o corpo dói. graças a deus. é um sinal de que não sou fresca, mas estou doente. mas mães ficam doentes?
sim. mães ficam doentes. talvez porque elas se enquadrem na categoria seres humanos. e seres humanos ficam doentes vez ou outra.
o corpo dói, e ondas sinistras de calor me fazem suar.
três dias depois continuo em casa. com ondas de calor sinistras, nenhuma febre, o cérebro lento e o corpo doído.
...
o melhor de ficar doente, indiscutivelmente, é que tudo fica lento. não só o corpo, que dói, mas a cabeça, que não pensa, os movimentos, que ficam em slow motion, e a vida, que corre mais devagar.
de toda a minha gigantesca to-do list, nada foi feito nesses dias. porque quando a gente fica de cama, só dá pra resolver as coisas de dentro, não as de fora.
...
sonhos. muitos sonhos. trocentos sonhos. há os sonhos das noites que parecem insones, e há os sonhos das sonecas diurnas, esses sim sonhos bons, porque as sonecas são longas, suadas e repousantes. tudo o que não dá pra pensar nem sonhar na saúde a gente pensa e sonha na doença. como eu sempre digo, deus é pai.
...
eu, como sempre me acho muito forte e muito brava, acho que meu corpo não fica doente. a culpa bate na minha cabeça feliz da vida, toc toc toc, 'você não vai trabalhar hoje? mas você tá passando mal mesmo hein?'.
e se eu não prestar atenção, vou trabalhar suando, com o corpo doendo, com os olhos ardendo.
...
e nesses dias corridos e quentes não se fazem mais amigos como antigamente. quem visita um amigo doente? eu não.
...
estou cansada.
...
ainda bem que antes de ser grande a gente é pequeno e grita mãe. e mães escutam os gritos antes de eles saírem da boca das crianças. como explicar? eu não sei, nem quero saber. mas assim é que é.
...
como terminar um texto tão triste? eu não sei.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

por que elas são tão loucas?

5:30 am - o despertador tocou. oh my god, eu ainda dormiria umas horinhas. lembrei que as crianças não estavam em casa quando acordei no meio da noite, e voltei a dormir. às 5:30am, com o sinistro horário de verão, a lua redonda tava brilhando bem feliz no céu escuro. me apronto - banho, café da manhã olhando pro céu alaranjado - e vou pra labuta. rodízio, então saio de casa às 6:30am.
um pouco antes das 7 am - chego ao trabalho. que é dentro de um estúdio de TV. jornal no ar, celular no silencioso. trabalho muito.
um pouco depois da 1pm - estou morrendo de fome. vou comer rapidinho. deixo a carol e o marcão na mesa e saio correndo, pago, volto pra labuta.
2pm - deu o meu horário, não devo fazer hora-extra, mas não terminei o trabalho.
2:15pm - mando e-mail pra minha editora, 'paula, tô indo, checa uma chamada que entra amanhã às 6am, please'.
pouco depois disso - o glauco me espera na calçada fumando um marlboro, bem feliz. vamos embora.
2:45pm - celular toca. o joão pergunta 'daqui a quantas horas você vai chegar?'. em 45 minutos, digo, porque vou ao mercado municipal de pinheiros. 'posso te pedir um favorzinho? você pode comprar um sorvete, napolitano?'. sim, eu posso.
3pm - chego ao mercadão. peço um zilhão de bifes no açougue, saco dinheiro pra compar o sorvete pras crianças, compro frutas secas e chás a granel, compro frutas frescas, volto pro açougue. o sujeito tá lá, embalando os contra-filés e os bifinhos de filé mignon. ele tem uma faca gigantesca na mão, e faz tudo tranquilamente, muito concentrado. eu suo, o calor é surreal dentro do mercadão. ele me pergunta se quero estrogonofe com as sogras. sim, eu quero. lembro de comprar linguiça, porque a giovanna, colega do joão, quer almoçar em casa e o prato preferido é esse. minha impaciência é ridícula, enquanto o cara corta o 'estrogonofe' e embala tudo de forma zen. ele termina, eu pago e parto.
quase 4pm - ligo pra casa do carro e peço pra esquentarem água do chimarrão.
4pm - chego em casa. coloco as compras no carrinho, subo. as crianças vêem TV, suadas. a doce nalva faz um sopa que eu vou comer com gelo dentro. o joão quer o sorvete, explico que ele pode ir comprar com a nalva. ele fica bravo, eu dou a grana e eles vão felizes, aparentemente.
pouco depois das 4pm - a manicure chega. pouco depois, joão e nalva aterrissam com o sorvete. sugiro ao joão que brinque de garçom. ele lava as mãos e serve pra todos: irmã, manicute, nalva e ele mesmo, claro.
quase 6pm - as crianças tão limpas e vão jantar. a manicure parte. a doce nalva também. o joão tá na cama, acho que dormiu, mas ele se senta e diz que não jantou.
6:15pm, aproximadamente - a lívia corta papéis, grampeia-os, risca com uma caneta, 'eu preciso de uma caneta, mãe', diz ela, muito séria. o joão janta, febril. dentes escovados, levo os dois pra cama.
depois das 6:30pm - o umidificador de ar faz um baruhlo estranho. olho, vejo que tem água. desligo, ligo, continua o barulho. olho bem, e vejo que não há água. encho o reservatório de água, coloco-o de volta, zzzzzz, ele volta a funcionar. ufa, economia de 250 reais. pensei que teria de comprar outro.
quase 7pm - o edu, que salva meu computador toda vez que a máquina tem falência múltipla de órgãos, liga. diz que vai chegar perto das 8pm, 'tudo bem?'. não, respondo. então ele virá amanhã. ufa!
7pm - crianças dormem. pago o estacinamento, que vence amanhã. faço as contas. como se planta dinheiro? é preciso regar todo dia?
quase 9pm - escrevo feliz. minhas costas estão doendo um pouquinho, bem pouquinho. respondi e-mails dos últimos 3 dias. tomo uma cerveja preta geladinha. vou comer sopa com gelo (ah ah ah) e vou dormir.
mas por que será que as mães ficam cansadas? será porque elas são loucas? ah ah ah mil vezes.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

ela não cabe dentro dela

eu tava voltando pra casa, dirigindo os últimos metros dos 50km diários, quando vi uma mulher andando na calçada ao lado de um garoto que, pra mim, era o filho dela.
a mulher vestia uma bata pink, uma calça jeans e umas sandálias de salto alto. tinha os cabelos compridos, bem cuidados, e uns óculos de sol enormes, acho que rosa.
ela andava e saltava aos olhos o desconforto. ela não cabia nela mesma. ela parecia não caber na vida dela.
como explicar isso?
fiquei pensando nas pessoas que falam e escrevem sobre elegância, sobre vestir-se bem. e lembrei da máxima da elegância, que é estar bem vestido e confortável metido na roupa. tanta gente - eu inclusive - diz que entre a elegância e o conforto, opta pelo segundo. mas os elegantes de verdade vestem-se bem sem abandonar o conforto.
porque eles cabem dentro da vida deles e cabem dentro das roupas que vestem também. bingo!
as pessoas que cabem dentro das próprias vidas podem vestir qualquer coisa que fica ótimo. lembrei dos pescadores em santa catarina, quando eu era muito feliz e sabia, e alugava casinhas singelas na praia da pinheira, que hoje já não é mais uma prainha singela nem tão linda. os pescadores vestiam camisetas velhas, shorts em tecidos sintéticos e havaianas gastas, e pareciam ótimos.
mas as roupas são a parte menor da história. mas mostram claramente como estamos lidando com as coisas da nossa vida.
o carro em que a gente anda, a casa onde a gente mora e o trabalho que a gente faz também cabem - e trazem conforto - ou não cabem - aí ajustes são necessários - na vida da gente.
e o esforço, hercúleo, é descobrir o nosso tamanho. pra tudo caber dentro da gente. até as pessoas que a gente ama e o olhar que a gente tem pro mundo.
porque o conforto não vem de fora, mas de dentro. ou você nunca comeu um PF numa espelunca que foi uma refeição inesquecível e achou horroroso um jantar num restaurante mega blaster incrível?
nas palavras do sábio hermann hesse:
"nada posso lhe oferecer que não exista em você mesmo. não posso abrir-lhe outro mundo além daquele que há em sua própria alma. nada posso lhe dar, a não ser a oportunidade, o impulso, a chave. eu o ajudarei a tornar visível o seu próprio mundo, e isso é tudo."
dio santo!

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

a ruiva falsa e suas belas rosas laranjas



Grande é a poesia, a bondade e as danças,
mas a coisa melhor do mundo são as crianças.
Fernando Pessoa

dias e dias sem escrever. muito trabalho, muito cansaço.
enquanto um guindaste gigantesco (mas será que existem versões compactas?) já içou três contêineres do meu quintal, também conhecido como a obra do metrô, me sento e olho pra essa máquina com desânimo.
o exercício hercúleo das últimas semanas tem sido não reclamar da vida, que anda muito, mas muito chata.
nessas horas adoro ouvir histórias dos outros, pra saber que a vida é dura mesmo, mas que tem gente que dá conta do recado com mais alegria do que eu.
não tenho respondido aos emails dos meus amigos, muito menos encontrado meus amigos. acho isso o ó, mas mais o ó ainda é achar que às vezes a vida não tem a menor graça.
...
o argumento que ela usava para defender com convicção a virgindade era que, 'depois de experimentar, não dá mais pra parar'. ou, em outras palavras, elaboradas por mim muitos e muitos anos depois, enquanto fumava um cigarro na janela do meu apartamento, é 'sexo vicia'. bizarro. mas eu fiquei impressionada quando pensei nisso ontem. eu não lembrava mais disso.
mas essa lembrança, que eu desenterrei das profundezas da minha cabeça (ou teria sido do meu coração?) me fez pensar sobre o que é bom e o que não é bom. por que será que tem gente que tem medo do que é bom? é porque depois que experimentamos o que é bom, é duro, amargo, azedo e insuportável ter o que não é bom. é só lembrar do sofrimento que traz uma dieta alimentar, do horror que é não ter dinheiro, do sentimento de inferioridade quando a gente descasa, do cansaço que dá quando a empregada tira férias, da tristeza que é um dia sem risadas, da dor que a gente sente quando não ama ninguém.
...
num ato de sapequice, deixei meu cabeleireiro atingir o nirvana e tosar meus cabelos. depois, ele me transformou numa ruiva falsa. e o que era pra ser uma celebração de uma nova fase virou uns suspiros. descontando a economia do shampoo, nada mudou. oh my god, mas como eu posso ser tããããão chata?
...
agora a caixa d'água que enfeitava a paisagem da janela do quarto dos meus filhos jaz no meio do terreno da obra do metrô, presa a alças com ganchos nas pontas que estão presas ao gigantesco guindaste. daqui a pouco o ió ió ió da marcha à ré de algum caminhão grande e velho vai entrar pela janela da sala e a caixa d'água vai embora. mudanças na paisagem, ou como disse a garota do departamento de relações públicas do consórcio da linha amarela, que toca essa obra barulhenta, 'eles estão fazendo o projeto de paisagismo'. fino, non?
...
agora o que entra pela janela da sala é a música da escola de balé, com os gritos da professora. é um barulho reconfortante, pra me lembrar que eu poderia dançar um pouco mais, ou rodopiar feito um dervixe.
...
as rosas eu ganhei da renata, que veio ao brasil com o pequeno andré e com o marido, o joão. e flores existem pra gente lembrar que a vida é bela. um presente da cidade, aliás, que tá tomada de flores rosas, roxas, vermelhas. bem feito: pelo menos quando eu tô nas minhas duas horas diárias de 'vamos ver qual pista anda mais rápido', eu não acho a vida chata. eu acho a vida linda. e lágrimas molham minhas bochechas.

domingo, 4 de outubro de 2009

sobre a limpeza das gavetas e a felicidade

são quase 8:30pm, e pra mim já é madrugada. acabamos de chegar em casa. coloquei o pijama na lívia e no joão, escovei os dentes deles e os coloquei na cama. eles dormem.
a tereza me ligou na sexta. disse que ia fazer uma festinha pro gabriel no domingo, que é hoje. delícia.
trabalhei, cheguei em casa exausta, coloquei as crianças no carro e partimos rumo à casa da tereza. estou trabalhando há 21 dias sem parar, e ainda trabalharei mais cinco dias. fui cansada e feliz.
sentei numa mesa ao lado da piscina, tomamos vinho. homens e mulheres casados, e uma mulher avulsa. eu.
demos muita risada. e então, depois do parabéns, a miriam nos presenteou com uma dança. uma dança circular que, como toda dança circular, enche qualquer coração de alegria.
é tarde para os parâmetros de crianças que acordam às 6am, e é tarde para uma mãe que acorda às 5am.
como é bom dormir tarde e feliz.
...
ontem dei muita risada depois de ligar pra minha mãe. ela me disse que eu tinha um namorado, e eu disse a ela que ele - o namorado - ainda não tinha sido apresentado para mim.
tudo por causa do texto que escrevi antes deste e que ela nem leu! alguém leu e disse a ela que eu tinha um namorado.
...
agora falemos da limpeza das gavetas. eu tinha 17 anos, acho, e fazia uma terapia desenvolvida pelo roberto freire. e o exercício era o seguinte (acho que já falei disso): cada um levaria o que tinha dentro de uma gaveta para a terapia. e então fizemos bolinhos: o bolo do que era lixo, o bolo das coisas que podiam ser doadas e o bolo das coisas que tinham alguma importância e que, por isso, deviam ser organizadas.
o grupo devia ter umas 20 pessoas. e os bolos eram enormes. o maior de todos era pro lixo. depois vinham as doações. e, por último, umas pilhas bem pequenininhas, das coisas que importavam, que faziam sentido.
...
foi de repente, e eu nem senti. mas um dia me dei conta de que eu tava conseguindo jogar no bolinho do lixo tudo o que não presta. o tudo quer dizer pensamentos, amizades, ideias, comportamentos.
...
minhas costas pesam. daqui a seis dias vou ao chinês para aliviar a dor física. ele vai me sovar, torcer o meu corpo (que vai responder com muitos crecs), vai colocar 16 agulhas nas minhas costas e pescoço e cabeça, e eu serei mais feliz.
o trabalho está árduo, e o que me alivia é olhar a cara dos meus colegas e ver que tá pesando e doendo pra todo mundo.
...
deus esteja.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

não ao que não serve mais

mas por que uma pessoa fica mais de 15 dias sem escrever num blog?
trabalho. dias e dias de trabalho sem parar. uma maravilha, no bom sentido, e no mau também.
...
o bom de ralar é aprender a dizer não. e nem dói. não fui encontrar minha amiga querida que mora no chile. porque tava babando. e tenho deixado de fazer muitas coisas. uma maravilha. prevaricação pra uns, nirvana pra outros.
...
as japonesas, me contou minha amiga emily, ela mesma uma japonesa de kobe, cortam os cabelos quando terminam um namoro. e isso significa que começa uma nova fase na vida delas. antes de lembrar das palavras da emily, que quando tomava tequila em oxford ficava com as bochechas muito vermelhas, resolvi cortar meus cabelos. bem curtos, ah ah ah. pra celebrar uma nova fase.
...
gostaria de estar inspirada, mas estou cansada, muito cansada. e a inspiração foi dormir antes de mim. porque amanhã de manhã ela tem de acordar e ir pro trabalho comigo.
...
ele disse que sexo pode ser uma brincadeira. e eu fiquei com isso na minha cabeça. hum, transformar coisas complexas em coisas simples é melhor que tomar banho de mar, melhor que dormir na rede, melhor que tomar água de coco na bahia, melhor que tomar prosecco gelado. por que será que ouvimos as coisas só quando elas têm de ser ouvidas? será isso uma perda de tempo ou o jeito que a vida é e ponto final?
...
ele também me fala sempre da contenção. nossa, tenho a impressão de que nunca vi essa palavra escrita na minha vida. mas a contenção é outro motivo para celebrar. o exemplo que ele usava pra me falar disso quando isso era uma incógnita para mim era o vaso que transborda. algumas pessoas são como vasos sempre cheios que, é claro, sempre transbordam. é chato e histérico. e dá trabalho se livrar. não das pessoas, mas do meu próprio estado de transbordamento.
...
é engraçado como os objetivos de vida às vezes são coisas singelas. eu tenho uma lista de singelezas, se é que essa palavra existe. coisa de mulherzinha trabalhadora. nas minhas primeiras horas sem trabalho vou fazer três coisas fundamentais para a minha felicidade, nesta ordem: ir ao meu médico chinês acupunturista, ao cabeleireiro e à depiladora. nunca foi tão fácil atingir o nirvana!
...
deus esteja. ou como canta mercedes sosa, gracias a la vida, que me ha dado tanto.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

coisas que eu nunca pensei que faria - parte 2

demorar uma hora pra chegar ao trabalho e achar que foi bom.
achar que foi bom parece um exagero, mas hoje não foi. eu levei 63 minutos para chegar ao trabalho, e cheguei aliviada, sorrindo, feliz da vida.
há 60 dias faço caminhos diferentes - desde que voltei à vida corporativa, depois de alguns meses de prevaricação. nos primeiros 30 dias, meus filhos estavam de férias, então o caminho casa-corporação era mais curto.
mas as férias intermináveis acabaram, e com o fim delas vieram os longos, longuíssimos trechos que eu tenho de percorrer todos os dias.
no início eu ficava com falta de ar. mas agora já evoluí e só sinto dor de barriga. às vezes acho que vou vomitar, mas é um pouco de fantasia. eu ainda não vomitei por causa disso.
primeiro veio a parte quase lúdica: ver no google maps quais os caminhos para ir do km 17 da raposo tavares, a.k.a escola das crianças, até a barra funda, a.k.a. meu local de trabalho. vi vários caminhos no mapa, e experimentei um por um.
dia 1 - pela marginal tietê. mas saí antes do que devia, peguei uma avenida parada, e achei que era ruim.
dia 2 - rodoanel. claro!, como eu não tinha pensado nisso antes? chovia, e lá fui eu conhecer um trecho dessa via que, me diziam, era maravilhosa. mas aí tive uma surpresa: o rodoanel também para. depois de 45km percorridos em uma hora e meia, cheguei ao trabalho decepcionada.
dia 3 - marginel tietê, agora pegando a saída correta. bem melhor. mas depois de vários dias, o trânsito piorou, as obras tomaram mais pistas e levei uma hora e meia para chegar ao meu destino.
quinta-feira da semana passada - tentei ir pela lapa. me perdi. em vez de parar na pio XVI, fui dar perto da anhanguera. dei risada, e uma volta enorme, e cheguei via sumaré.
mais uma vez fui dar uma olhada na inteligência do google maps e sim, ali estava o que eu supunha: eu podia pegar a avenida sumaré. e lá fui eu, raposo tavares, av. escola politécnica, ponte do jaguaré, pinheiros, e opa!, parou. eu não podia acreditar. enquanto tentava raciocinar se devia parar na casa de uma amiga para ir ao banheiro, comecei a ficar aflita com a possibilidade de chorar de raiva. chorei e segui, a 5km/h quando o farol abria. num surto de raciocínio ilógico típico de quem está há uma hora e meia dirigindo, segui pelas ruas congestionadas pensando 'é claro que adultos não fazem xixi nas calças'. cheguei ao trabalho duas horas e muitas lágrimas depois. e sem ter feito xixi no carro, claro.
hoje - tentando manter o bom humor, que por sua vez teimava em não me acompanhar, fiz um caminho que o google maps não conhece. dei voltas e mais voltas por ruas pequenas e sem trânsito. e cheguei ao trabalho em apenas 63 minutos.
noooooooossa.
estou ficando com um pouco de nojo de dirigir. e tenho me portado como uma pessoa nojenta enquanto brinco de carrinho. digamos que eu já fui mais civilizada no trânsito. não que eu tenha feito ultrapassagens pela direita ou cortado motoristas, mas digamos que meu modus operandi dentro do meu pequeno carro está longe de ser elegante.
como dizia a marilei, quando perdeu metade do espaço da sala dela na rede globo, 'deus tá vendo tudo'. mas será que isso pode aliviar meus pensamentos sinistros sobre as duas ou três horas por dia que passo sentada dirigindo todo dia? (aha, até então eu só estava falando da minha IDA ao trabalho. mas tem a IDA à escola, e a VOLTA do trabalho)
não sei. mas que acho que melhores coisas têm de vir, ah, isso eu acho. e, enquanto as melhores coisas não vêm, eu uso a frase como meu mantra, pra que os surtos diários sejam breves e indolores. deus tá vendo tudo.

domingo, 13 de setembro de 2009

coisas que eu nunca pensei que faria - parte 1

gastar R$ 165 para ir ao cinema.
meus filhos são pequenos, e eu acho que cinema não é o melhor programa do mundo pra eles. pode ser um programa, e só. e eis que meu filho queria ver um filme que EU também queria. e o filme, Up, entrou em cartaz.
e então hoje ligo meu computador de manhã cedo para comprar os ingressos e evitar chegar ao cinema e ver que a sessão tá esgotada. cada filho se senta de um lado, e ficam olhando eu fazer a compra. surpresa: ao comprar pela internet, paga-se MAIS CARO. ó! diferentemente de um livro, por exemplo, que é 30% mais barato se comprado sem você colocar os pés na livraria. fiquei em dúvida, mas achei covardia de mãe desistir no meio do caminho. 60 reais.
escolhi uma sessão no início da tarde, pra evitar aquela multidão que estranhamente entope shopping centers aos domingos. e nova surpresa: o restaurante onde eu pensei em comer comida estava em reforma. e os outros dois, fechados.
nessa hora o joão gabriel já tinha pronunciado a palavra mc donald's umas 48 vezes. dou o braço a torcer, e vou comprar comidinha falsificada pra eles. 20 reais.
na hora de colocar a bandeja na mesa, ploft, o suco de uva da lívia cai. numa tentativa hercúlea de manter a fleuma, peço ao joão que vá pedir a uma das atendentes que alguém vá limprar a meleca. ele volta e diz que a moça falou algo que ele não entendeu. mudo de mesa, e vou buscar uma água de coco pra minha filha. 3,25 reais.
quando eles terminam, vamos aonde eu queria comer comida - já era meio-dia, e o salão estava aberto. explico que meus filhos não vão comer, e graças a deus cada um tinha uma bexiga vazia para encher e esvaziar 956 vezes enquanto eu me servia e comia. a comida não era horrível, mas estava a muitas léguas de distância de algo que eu chamo de bom. no fim cada um pedm um suco, e meu filho devora os pães do couvert depois que eu disse que ele não almoçaria de novo, que era o que ele queria. 54 reais.
e então eu tenho a brilhante ideia de não enriquecer mais ainda o dono do cinema e vou com eles ao carrefour comprar chocolate. e isso foi quase rápido, simples e barato. 3,75.
quando estamos a caminho do cinema, minha filha diz que tem de ir ao banheiro e começa a rebolar. mau sinal. chego nas vendedoras de pipoca do cinemark, uma me diz que os banheiros ficam 'no caminho para as salas'. a resposta me surpreende e eu pergunto se tenho direito de usar banheiros do cinema onde vou ver um filme. ela solta um grunhido que devia significar 'sim'.
a próxima barreira é a moça que pega os tickets. peço pra ir ao banheiro, e ela solta uns três grunhidos. mas deus é pai e meus filhos de fato precisavam ir ao banheiro, o que iria me livrar de sair no meio do filme com dois filhos, águas, pipoca, agasalhos e minha bolsa para levá-los para fazer xixi.
todos felizes, vamos comprar pipoca. e água. 15,25. meu filho pergunta o que é uma carrinho de papelão em pilhas no canto do balcão, e a atendente fala que é combo médio fucking blaster. pergunto o que significa, e era uma pipoca e um refrigerante. mas sem escândalos, porque nesse momento cada filho segurava sua garrafa de água - um só toma com gás, o outro só sem gás.
volto à moça do ticket para passar meu cartão - um sistema incrível, mas a maquininha pra passar o cartão tava quebrada e ela fala no seu pequeno microfone acoplado a fones de ouvido com a bilheteria. pergunta se tem uma fulana de tal, e a fulana de tal era eu. então ela olha pra mim e pros meus filhos e confirma se são três ingressos. como éramos três pessoas, acho que ela até tinha raciocínio lógico. dessa vez ela conseguiu ser simpática, afinal eu TINHA ingressos para poder fazer xixi no banheiro do corredor das salas.
finalmente chegamos dentro da sala. olho no relógio, e oh my god, faltam 30 minutos pro início do filme.
brincamos, conversamos, e os trailers de desenhos começam. e logo o filme. a lívia sentou no meu colo e disse 'acho que vou tirar uma sonequinha'.
o filme termina, as águas também, e a barra de chocolate também. e minha energia também. vamos andando e pegando escadas rolantes, acho um caixa do estacionamento, R$ 9, pago, achamos o carro sem demoras, e chegamos em casa em poucos minutos.
como se fosse um milagre, meu filho começa a montar um lego cujas peças ainda estavam em plásticos fechados dentro da caixa, e minha filha brinca com um quebra-cabeças e depois fica furando papel e recortando marcadores de livro, diz ela.
o dia foi lindo. sol, bom humor, um pouco de bola e bicicleta no pátio do prédio, chimarrão, cinema, brincadeiras em casa, e um jogo de canastra que começou cedo de manhã e terminou agora há pouco. meu filho ganhou.
e eu, que acho que sou pão-dura, contei pra uma amiga que me ligou que tinha gastado 150 reais para ir ao cinema (eu ainda não tinha somado, pra escrever este texto). e ela disse que isso é são paulo, e que por isso ela faz uns programas off-cinemark, tipo levar as crianças ao teatro no clube. clube? i can't afford to it.

sábado, 5 de setembro de 2009

a cidade cinza parece estar mais cinza hoje

é bom quando dias cinzas combinam com pensamentos cinzas. como hoje.
...
ele é um cara tão, mas tão elegante, que quando eu disse a ele que fumava ele disse 'que feio'.
...
falo com a minha irmã por telefone e ela me conta que tá bem, tá muito bem. bem como não esteve nos últimos anos. mais precisamente, nas duas últimas décadas. coisas que para mim são pequenas para ela eram muito, muito grandes. gigantescas, e horrivelmente assustadoras. e então esta semana, como que por milagre, ela deitou, dormiu e acordou no outro dia. feliz. e me ligou cedo, acho que lá pelas 7am. e disse que tinha dormido sozinha em casa com a filha dela. coisa que ela não fazia desde os 18 anos.
...
tem dias em que a distância não importa, e que eu nem penso nela. mas tem dias que eu sinto saudades das pessoas que moram a mais de mil quilômetros da minha casa. e hoje é um dia desses. queria agora estar sentada na sala da casa dos meus velhos, tomando um mate e conversando com eles. para depois almoçar uma comida boa feita pelo meu pai e comer uma sobremesa feita pela minha mãe. e depois tirar uma soneca daquelas de sonhar.
...
nenhum sentimento conecta a gente ao coração como a tristeza. quando ele me disse isso eu fiquei desconfiada. mas ele fala verdades. muitas verdades. tantas que às vezes eu não aguento, e acho que vou cair. mas não caio. a gente é sempre mais forte do que imagina.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

quieta

as palavras dela entraram pelos meus ouvidos quando me sentei sozinha, na sala escura, para meditar: aquietar o corpo para aquietar a alma. não é ipsis literis o que ela diz quando propõe uma meditação, mas esse é o sentido.
o corpo tem de parar para a alma parar também.
vou ficar mais quieta. vou andar mais devagar. vou dormir mais. vou falar menos. vou reclamar menos. pensar menos não dá, mas pensar mais devagar é possível, non?
vou respirar mais devagar e tomar banhos mais lentos. vou me mexer mais devagar e dirigir mais devagar também.
vou viver mais quieta.
agora é só imprimir minha lista de desejos e espalhá-la: na bolsa no quarto no banheiro dentro do carro no meu computador do trabalho. e dentro da alma, como faço?

terça-feira, 1 de setembro de 2009

a vida pode ser bela, muito bela

a cunhada de uma amiga chamava de 'show de horrores' o fim do dia, quando os três filhos chegavam da escola. banho, jantar e cama. é tough. mas é real.
...
vou desenvolver um botão, que poderá ser acoplado a qualquer criança. o botão só poderá ser acionado por mães, e durante ataques de descontrol (das mães, óbvio). vai ter três opções:
nível 1 - meus filhos ficarão doces e nenhum vai espancar o irmão
nível 2 - meus filhos vão me obedecer porque mamãe chegou do trabalho e tá exausta
nível 3 - o mais sensacional de todos: meus filhos vão dormir, porque tá na hora.
...
a motorista dos meus filhos parou no farol e quando um daqueles insuportáveis vendedores de bala passou pelo carro dela a lívia pediu pra ela comprar balas. e então a luli, uma pessoa adorável, um anjo que apareceu na minha vida, disse que balas não eram legais, porque não faziam bem pros dentes. e disse que ela mesma nem gostava de balas. ao que a lívia respondeu: 'eu também não gosto. mas a minha barriga gosta, e a minha garganta também'. e a lívia tem só 4 anos. e não ganha balas da mãe.
...
deus esteja, que eu vou tomar uma stella artois enquanto meus amigos não chegam.

domingo, 30 de agosto de 2009

sobre passarinhos, crianças e alegria

não sei se os meus ouvidos estavam mais atentos ou se os passarinhos estavam mais animados. o dia tá acabando, o sol já se pôs, e eu escutei a música deles o dia inteiro. há pouco, na janela da sala que dá pra obra do metrô, tava pensando nisso quando um beija-flor chega perto, muito perto da tela de proteção da tal janela.
eu tinha acabado de chegar de um almoço. minha amiga tinha me dito, quando veio me pegar em casa e eu ainda estava de pijama, que eu devia usar o vestido que refletisse o que eu tava sentindo. então, podia ser qualquer vestido do meu armário. a paula é assim, fala as coisas sem rodeios. e eu saí com um vestido roxo e cheio de flores.
durante o almoço, a elce, amiga da paula, conta como trabalha em UTIs. ela é pediatra, e além de trabalhar em UTIs, faz exames no coração de crianças recém-operadas. e ela diz que tem fases em que morrem muitas, seguidas de outras fases em que não morre nenhuma. assim é.
nisso a paula conta como é lidar com as pacientes que têm câncer. e fala de uma, conta das cirurgias feitas nela e que agora não tem mais o que tirar caso o tumor volte a crescer. e como ela dá conta? vendo as crianças gorduchas cujos parto ela é a obstetra.
em casa, sozinha, sinto saudades dos meus filhos, que vão voltar pra casa daqui a pouco. e sinto uma coisa chata, que acho que responde por solidão. e, pra fechar o dia em grande estilo, assisito a um vídeo com pessoas dançando muito, mas muito felizes. e não posso deixar de dar risada.

sábado, 29 de agosto de 2009

o bom humor dela é absurdo

a primeira coisa que ela disse quando eu abri a porta foi "nossa, mas como você é linda". depois de andar três horas sob o sol com um boné na cabeça e de tirar uma soneca daquelas de sonhar, escuto isso.
eu não a conhecia, e ela veio até a minha casa fazer a minha unha. desceu no ponto errado do ônibus, depois caminhou pro lado errado da minha rua. me ligou pedindo desculpas pelo atraso. e quando chegou se deculpou mais uma vez. mas tão doce que nem tinha como não desculpar.
como ela não é manicure, mas podóloga - um nível bem superior, descobri há pouco. ela usa luvas, material esterilizado, toalhas descartáveis, uma maquininha para fazer algo nas cutículas que eu ainda não descobri o que é e uma lixa redondinha que é também colocada na tal da maquininha e quase me matou de cócegas nos pés.
a rute é uma mulher bonita, alta, magra. me contou que já ganhou muito bem. o muito bem no caso é mais do que eu ganho atualmente. mas um dia ela encheu o saco do estresse e das clientes muito ricas que mandavam o motorista buscá-la em casa no domingo. e ela argumentava que estava com as crianças em casa, e a cliente dizia para levar as crianças. e ela levava.
mas um dia foi demais. e então ela me conta que pediu a deus para levar embora essas clientes chatas e aparentemente sem limites. 'e o anjo levou o bilhete'. eu não entendi, e ela me explicou. o anjo tinha levado o bilhete para deus, e deus tinha atendido o pedido dela. agora ela pede que deus traga novas e boas clientes. acho que os papéis estão sendo entregues pouco a pouco.
ela vai me contando do filho de 17 anos, autista, que não fala. quando é preciso, o filho de 10 anos cuida do irmão de 17.
ela tem certeza de que o filho vai se curar. até pouco mais de 1 ano, o moleque falava algumas palavras e se desenvolvia normalmente, pelo que entendi. mas aí ele parou de falar e no lugar das palavras vieram os grunhidos. ela só descobriu o que ele tinha uns quatro anos depois, quando o filho tinha quase 5 anos.
ela me conta que a mãe dela teve 17 filhos. e que diz pro filho de 10 que, se ele não for um bom menino, ela vai mandá-lo para o rio de janeiro, onde mora a avó. diz ela que na casa dos pais dela muitos primos passaram temporadas, e até filhos de amigos. pra tomar jeito.
uma amiga me liga, e quando desligo conto que fui convidada pra ir comer uma pizza. sinto preguiça e digo pra rute que eu teria de tomar um banho antes de sair. e ela vem com esta pérola: 'mas alguém vai te ocupar hoje?'. ahn? quando entendo, caio na gargalhada. até pra falar essa mulher que tem uma vida beeeem mais dura do que a minha é doce.
quando abri a porta pra ela ir embora, ela sai gargalhando, dizendo que eu nunca mais vou ligar pra ela vir fazer minha unha, porque ela falou 'mais que homem que encanta cobra'.
antes disso, ela me falava de como acha absurdo as novelas estarem tomadas por gente que passou por reality shows mas que não estudaram para serem atores, como as grandes atrizes - tônia, fernanda montenegro, beatriz segall. 'elas não foram jogadas pela janela'. ahn? ué, elas ralaram, estudaram, se esforçaram. não entraram feito ladrões pela janela de uma casa para roubar tudo o que tinha dentro. palavras da rute.
meus deus!, mesmo que eu não tivesse gostado dessa mulher eu teria de chamá-la para vir à minha casa mais umas vezes, só pra melhorar o meu repertório de expressões sensacionais.
e agora, com unhas vermelhas e com um pouco de calor, sinto a alegria dessa mulher dentro da minha casa. e então vou pedir pro meu anjo a companhia de pessoas muito, mas muito bem humoradas. e esperar que ele leve o bilhete.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

sobre vinhos alegres e vinhos tristes

foi uma descoberta. e aconteceu de um dia para o outro. literalmente.
primeiro tomei o vinho triste. tinha chegado em casa no final do dia, e achei que um pouco de vinho ia me ajudar a digerir entender aceitar as palavras duras que tinha acabado de ouvir. sim, eu, como a maioria dos mortais, passa mal quando escuta verdades profundas. daquelas que tocam a alma sem passar por nenhum lugar antes. daquelas que a alma escuta antes dos ouvidos, antes do coração.
e então, e eu ainda não sei por quê, liguei pra ele. eu não costumo fazer isso, porque ele é uma pessoa pra quem eu não tenho nada pra falar, descontando umas coisinhas cotidianas que podem ser resolvidas por email. mas eu liguei, e o telefonema durou horas. um telefonema de horas pra mim significa qualquer conversa pelo aparelho que dure mais do que dez minutos. mas durou mais do que isso. muito mais. pelo relógio talvez uma hora, mas pela minha alma durou uma eternidade.
eu consegui falar coisas horivelmente profundas dolorosas verdadeiras pra uma pessoa pra quem eu costumo falar, no máximo, oi e tchau. muitas vezes só oi, porque o tchau eu acabo achando desnecessário.
chorei, senti falta de ar, chorei mais ainda. quando desliguei o telefone, não acreditava que tinha rolado uma DR com quem eu não tenho R nenhuma. legenda: discutir a relação.
depois dessa DR sinistra, fiquei triste, mas tenho a impressão de que a tristeza não é em vão. a raiva que mora dentro de mim foi dar uma volta, e no lugar dela a tristeza chegou, sentou e ficou. tristeza pelo que já passou, pelo amor que era lindo e acabou, pelas coisas que eu sempre disse e que ele nunca escutou e, pior de tudo, pelas coisas que ele sempre disse e eu nunca considerei. porque nunca as entendi.
...
o vinho alegre veio logo depois. mais especificamente, uma noite depois. quando eu tava dura, eu e meu corpo e minha alma, tentando juntar uns pedaços de mim que tinham ficado separados desde a noite anterior.
o vinho alegre veio acompanhado de pessoas doces, comida boa, músicas lindas e risadas. e de um vaso com três flores cor-de-laranja belíssimas. o oposto da noite anterior, que tinha tido conversa amarga, um pouco de sopa, nenhuma música e muitas, muitas lágrimas.
o vinho alegre era suave, tinha cheiro bom. era claro. diferentemente do vinho triste, que era quase amargo e escuro, horrivelmente escuro. vinhos tristes são escuros densos sem chão. uma merda.
...
talvez eu devesse ler um livro de auto-ajuda daqueles bem iditoas, que dizem que o importante é ter bons pensamentos, acreditar que as coisas vão dar certo e blablablá. mas tenho nojo disso.
me sinto uma adolescente. parece que todo o esforço tem sido em vão. coisa chata essa sensação de o-amor-próprio-chega-ao-chão-e-eu-me-sinto-uma-idiota.
...
faz frio lá fora. e aqui dentro também. e eu me lembro dos felizes dias que vivi em boston, quando fazia tanto frio mas eu estava sempre tão quentinha. uma parte doce da minha vida, quando achei bom sair do brasil e deixar um belo apartamento um bom emprego e um carro novo pra viver ao lado do meu amor. o bom disso tudo é que eu não sei se faria tudo de novo, mas não me arrependo de um segundo do que vivi lá. mesmo sabendo que, passados muitos anos, ele - o da DR - não lembra de nada disso nem nunca me disse que foi feliz como eu fui.
...
às vezes acho que os anjos tiram sonecas longas e acabam esquecendo de cuidar da gente aqui na terra.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

as minhas melhores amigas - sem singular

faz frio. lá fora e aqui dentro. o dentro é em mim.
noite passada dormi poucas horas, mas horas felizes. sonhei com o vazio. sonhos são íntimos, e raramente falo sobre eles. mas os sonhos da noite passada eram sobre o vazio. tudo era vazio. eu senti o vazio dentro de mim e as coisas que eu tinha de fazer - no sonho - eram vazias. meu trabalho, minhas ideias e o que eu sentia. tudo era vazio.
eu não tenho um dicionário de sonhos em casa, e meus muitos anos de análise ainda não me tornaram uma pessoa capaz de entender o que vem de dentro de mim quando durmo. mas quando acordei senti um alívio de sentir o vazio. é o espaço para coisas novas. e eu sei o que isso quer dizer. mas não vou contar pra ninguém, só pra mim, porque é muito pessoal.
a semana foi übermegablaster enlouquecedora. muito trabalho, fim das férias escolares, início do trânsito surreal absurdo e nojento da cidade cinza. fui uma hard working woman e uma geleca todos os dias. muita energia para acordar sair trabalhar voltar cuidar dos filhos dar conta da empregada pagar contas e dormir sossegada.
não atendi todos os telefonemas nem respondi todos os emails. e minha to-do list aumenta em vez de diminuir. me surpreendo com pessoas jovens que trabalham mil vezes melhor do que eu e com pessoas que não sabem trabalhar - ou eu sou louca?
a paciência é a maior virtude, depois vem a compaixão. aprendi isso vivendo e lendo dalai lama. mas quando vou aprender isso com o coração? não sei.
um dos telefonemas que não atendi era da minha melhor amiga flávia. mas sou educada quando sei que isso é bom para a minha alma e liguei pra ela depois que meus pequenos herdeiros estavam dormindo em suas fofas e cheirosas e muito quentinhas camas.
a flávia tava louca mas conseguimos conversar por uns longos 15 minutos. os três filhos dela ainda estavam acordados. e meu vazio recebeu doses cavalares de amor. eu adoro as minhas melhores amigas. não são muitas, mas são o suficiente para o meu coração se encher de alegria e para eu saber que tudo faz sentido.
minha melhor amiga carla veio tomar sopa de cenoura com curry e comer salada de grão de bico com quínua comigo esta semana. um dia antes da visita gastronômica ela tinha vindo à minha casa chorando para pegar o carro emprestado e ir a uma festa. a carona dela tinha dado o cano. ela raspou meu carro ao sair da garagem, e me ligou chorando. disse pra ela ir pra festa. semana que vem vou ao mecânico pra arrumar o carro. e negociar condições de pagamento decentes pra carla.
minha melhor amiga paula responde só os emails essenciais. e toda vez que eu os recebo meu coração se enche de alegria. quando fomos trabalhar juntas, um ano atrás, achavam que nunca daria certo. e tá dando certo pela segunda vez. nem sempre os achismos fazem sentido.
ufa!
como é bom sentar e escrever e saber que meus melhores amigos vão ler e seus corações vão se encher de alegria. ou se esvaziar de alegria. que no fim é a mesmíssima coisa.
minha melhor amiga reh me disse esta semana que meu corpo está livre dos metais tóxicos. e disse pra eu seguir minha dieta superhipermegablaster sinistra, sem açúcar nem laticínios. mas me disse que eu tenho de fazer algo com o meu corpo. leia "vai fazer um exercício, nega!". eu vou, quando der. mas não sei quando vai dar.
ainda faz frio lá fora. e aqui dentro também.
depois de ler "a moça sem mãos" dos irmãos grimm para o meu filho, uma ou duas lágrimas fininhas rolaram pelas minhas bochechas. "pode chorar, mãe", ele disse. "mas da próxima vez que contar essa história, não." no conto, um anjo ajuda a menina que teve as mão cortadas pelo pai a pedido do diabo. e deus faz suas mãos cortadas crescer novamente. claro que não é uma história para crianças, mas por algum motivo que desconheço meu filho decorou os contos dos irmãos grimm dos oito volumes que compõem a obra completa em português e me pede para contar contos estranhíssimos.
meu estado geleca de quando cheguei em casa há quatro horas evoluiu para um estado "i am freezing". hora de tomar uma sopa que a doce nalva fez. e de ir dormir chorando, sabendo que o vazio não é em vão.
o novo está chegando, para ocupar o lugar do velho, que já partiu. estou gelada. e isso é bom. porque vou me aquecer. e vou dar risada quando deitar na minha cama cheirosa e macia e quente e dormir. no meio da noite vou morrer de calor, chutar metade dos cobertores e lembrar da rebeca do pedro da nádia do caio. e vou dormir feliz.
assim é a vida.
deus esteja.

domingo, 16 de agosto de 2009

o corpo, a alma e a pressa

eu abri os olhos e vi que eram 6:58am. e lembrei que hoje era domingo. virei pro lado, me cobri e tentei dormir. mas minha cabeça pensava rapidamente, e meu corpo, mesmo relaxado, também parecia estar com pressa.
fiquei ainda quase uma hora na cama, mas uma falta de ar, um presentinho que a pressa traz com ela, não me deixou muito feliz. e então me levantei como se estivesse atrasada para viver.
tentei tomar o café da manhã devagar, e enquanto comia um pedaço de pão sensacional, com grãos integrais (coisa que está fora da minha dieta há alguns meses) recheado com frutas secas e castanhas, ia lendo o jornal. mas não consegui nem comer devagar, nem ler devagar. e como o antídoto da pressa para mim é a limpeza, fui lavar louça e colocar roupas para lavar na máquina. aproveitei para lavar com uma escovinha e água morna meu canivete, que tava pedindo uma limpeza. e desentupi a bomba do chimarrão, um trabalhinho zen que consiste em colocar um pedacinho de arame por dentro da bomba e depois lavar com água e assoprar. dói a boca.
estava com a sensação de estar atrasada ainda quando olhei no relógio e eram 9am!
na sala estou arrumando minha bolsa, minhas contas, uns papéis. quando meus filhos voltarem pra casa do final do dia a mesa da sala estará limpa, sem nada em cima, o que não acontece há um mês.
outro dia, enquanto arrumava meu armário, tirei umas fotos de antes e depois. here they are. e antes de eu pensar que posso estar mostrando sem inibições meu TOC, respiro aliviada ao entender que não é TOC, é inspiração. arrumar por fora para dar tempo de arrumar por dentro.

antes



não basta arrumar, é preciso limpar



inspirada no método marlene-manda-seus-filhos-arrumar-os-armários, que eu aprendi ao ouvir relatos do joão: tirar tudo, primeiro




ulalá! parece uma mágica, mas é o mesmo armário, com as mesmas coisas guardadas dentro



menos é mais





eu gosto de ter finais de semana livres. e por livres quero dizer sem nada marcado. nenhum encontro, nenhuma ida ao cinema, nenhum almoço. mas aconteceu o contrário. o pai dos meus filhos ligou na sexta pra dizer que viria buscá-los ãs 7:30am no sábado. aproveitei e minha manicure chegou antes das 8am. depois fui fazer um programa a-gente-rala-a-semana-inteira-mas-também-é-gente com a doce paula. fomos comprar roupas maravilhosas numa venda promocional, umas pechinchas. quando sentei para almoçar, numa salinha onde não se entra com sapatos num restaurantezinho indiano perto de casa, consegui COMER devagar. e pela primeira senti uma alegria enorme por estar separada. pensei no horror, no caos, na tristeza que seria a minha vida se eu não tivesse escolhido viver sozinha com os meus filhos. mas assim que saí do restaurante, depois de ter comprado uma caixa de incensos gorduchos e excepcionais, minha pressa voltou. e dirigi por uma hora para passar a tarde sentada escutando sobre shiva e parvati, divindades hinduístas que representam o homem e a mulher e que na mitologia passaram milhares de anos fazendo amor. quando dirigi outra hora para voltar pra cidade - o workshop era fora de sp -, encontrei com minha dinda, que está na cidade cinza a trabalho. exausta, fomos jantar. e assim que a comida acabou, disse 'vamos embora?'. fina, eu.
quando cheguei em casa, meu corpo doía. e pensei que ele doía não porque eu tinha passado o dia todo fazendo coisas em vez de não fazer nada, mas porque eu só tinha feito coisas boas e meu corpo doía de felicidade. iguais às dores que sentimos depois de passar um dia fazendo uma caminhada de 15km pela chapada diamantina ou depois de nadar por uma hora no mar.
hoje acordei pensando em shiva e parvati, pensando que eu queria sair para andar de bicicleta, pensando na ida a uma exposição com uma amiga querida, pensando no almoço que eu tenho na casa de outra amiga que tá numa casa nova, pensando na volta às aulas das crianças amanhã, pensando no abraço meu-deus-eu-vou-desaparecer-me-tornar-uma-nuvem-que-delícia que recebi depois do workshop de ontem. mas não tinha pensado numa coisa maravilhosa: eu não posso ir morar numa casa nem me mudar pro meio do mato porque eu não aprendi a viver sem pressa. só quando eu não sentir mais que estou atrasada para a vida é que vou poder construir uma casinha com janelões gigantescos e chão de madeira e uma varanda com rede e poltrona e mais um gramado pros meus filhos correrem e ficarem bem sujos de terra.
por ora minha visão idílica de mundo é morar no meu pequeno apartamento. e quando meus pés ficarem com saudades de pisar no chão, ir ao parque pisar na grama ou ir pra praia correr na areia.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

como dá trabalho - ou o banho de mar sem sol

ela me ligou ao meio-dia de sábado e disse que ia pra praia no final da tarde. eu não queria ir junto?, ela perguntou. eu fiquei morrendo de vontade, mas disse que não, as crianças tinham acabado de voltar da praia, eu queria dormir cedo, e queria que eles também começassem a dormir cedo, para se prepararem pro fim dessas férias infindáveis. mas a vontade aumentou. a minha, claro.
falei pro joão e pra lívia que a paula tinha ligado e queria saber se queríamos ir pra praia. sim queremos, disseram eles, em uníssono. e então combinamos que eles, a paula e o marco, passariam para nos pegar perto das 5pm.
fomos pra casa arrumar uma mochila para passar uma noite fora da nossa casa - um pijama pra cada, uma roupa de verão e outra mais quente, um maiô. pouca coisa. mais cobertores lençois toalhas travasseiros e uma comidinha e pronto, parecia que nos mudaríamos pra praia, não que íamos dormir UMA noite numa casa fresca e linda.
descontando a ressaca da ida, porque chegamos tarde e os pequenos quiseram ficar pro churrasco, e a da volta, porque pegamos um trânsito surreal e chegamos em casa perto das 10pm, foi uma delícia. banho de mar, crianças correndo e fazendo castelo enquanto adultos liam revistas e conversavam e tomavam cerveja e comiam bolinhos de bacalhau. depois mergulhos na piscina e outro churrasco maravilhoso. e pra fechar com classe, umas partidas de dominó com chá quentinho no final da tarde, quando uma chuva muito fininha molhava o almofadão que eu deixei na beira da piscina.
eu tive de me esforçar pra entrar no mar. não tinha sol, e ventava. mas a água não estava gelada - claro que minha opinião não é parâmetro, porque lá no rio grande do sul, onde eu nasci, o mar é sempre geladíssimo.
hoje, um dia depois do banho de mar, volto pra casa e meus filhos estão indóceis. a lívia chorava, o joão gritava, e a empregada, que tinha chegado às 6:30am, já tinha voltado para o doce lar dela. uma banheira morninha e os ânimos se acalmaram. um dormiu, o outro geme no sofá.
e então minha ficha caiu. fazer diferente dá trabalho. não diferente de ninguém, mas diferente de MIM MESMO. ir pra praia à noitinha e voltar à noitinha dá trabalho. dá sono e exaustão quando a bunda da gente fica quadrada e a das crianças dança na cadeirinha do carro depois de três horas sentados. mas se não desse o trabalho que deu, como eu ia tomar banho de mar e pular ondas e cantar músicas no mar com meus filhos gargalhando em êxtase?
minha paciência foi dar uma volta em cingapura, e meu filho não tem nada com isso. enquanto ele segue gemendo no sofá dizendo que não consegue dormir, eu lembro que estou com o corpo moído.
ontem era dia dos pais, e eu sempre acho essas datas estúpidas. estúpida até o pai deles dizer que não queria vê-los porque preferia dormir. e quando o joão comentou que 'o dia dos pais tá chegando né mãe?' no sábado eu tive de citar verbalmente a data estúpida. mas ontem não falei nada. não aguentaria ouvir a pergunta deles, 'por que não estamos com o babbo?'.
o joão pergunta se pode dormir na casa do pai hoje. peço pra ele ligar e perguntar. ele liga, pergunta e desliga. e não me fala nada com a boca, mas explica com os olhos. lágrimas escorrem das bochechas dele depois do segundo ou do terceiro telefonema. escuto ele perguntar se a empregada não está na casa do pai.
ele chora no meu colo e eu choro junto. e pensei meu deus eu nunca tive um pai que não morasse na mesma casa que eu. e lembrei de um aniversário em que meu pai não pôde passar comigo porque estava no rio, a trabalho. e quando ele chegou à casa da praia, onde minha mãe meus irmãos e eu passávamos as férias de verão, com um saquinho de jabuticabas de presente! ele tava tão emocionado que acho que eu chorei.
ontem queria ter comemorado o meu dia, mas achei que era demais. não queria citar a data estúpida. nem entrar nessa idiotice de dizer que sou pãe, pai e mãe.
mas que era meu dia, era. sem contar pros meus filhos, porque eles não merecem escutar algumas coisas na idade que têm. e quando crescerem vão ler o que eu escrevi e entender um pouco o porquê de algumas lágrimas que jorram sem vergonha dos meus olhos.
eu não me arrependo de nada. e isso é bom de dizer e de pensar e de escrever. mas que às vezes podia ser mais fácil, ah, isso podia. 'o mió da vida é os caminho, não os ataio.' não lembro onde vi ou ouvi. mas gostei.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

ode às rugas ou sobre as celebrações cotidianas

a reunião começou quando eu estava louca pra ir pra casa. tinha quase 15 dias que eu não via meus filhos, e eles tinham voltado da praia ontem, perto da meia-noite. eu estava dormindo, e o telefone tocou. eles estavam chegando. tirei o pijama, coloquei uma roupa e desci pra ajudar o pai deles a carregá-los escada acima. joguei os dois na cama, e dormi feliz. fritei por uma hora na cama, claro. acho que de alegria.
no meio da noite acordei, fui até o quarto deles, beijei os dois e voltei pra cama. a sensação era - e ainda é, quase 24 horas depois - de deitar e boiar nas nuvens. uma alegria que acho que nunca senti. uia!, isso existe?
...
a reunião rolou, e eu pensava em como tava boa. é engraçado quando eu acho que tudo tá bom. parece que tem algo errado. mas não tem. a reunião era sobre trabalho, mas o trabalho tem a ver com as pessoas, a idade das pessoas, e o que pensam as pessoas. o thales, meu editor, disse mais de uma vez durante a tal da reunião que se sente um 'tiozinho'. ele é um homem sábio, que já viveu quase meio século, e nem por isso é um velho. o cara tem histórias pra contar e, melhor de tudo, nenhuma arrogância. ainda bem que as rugas não vêm só. gentilemnte, elas carregam um pouco sabedoria.
...
anteontem, quando cheguei em casa, escrevi sobre as celebrações. mas deixei o texto dormindo, e ei-lo abaixo.
...
cheguei em casa quando o sol ainda brilhava alegremente no céu. abri as janelas pra iluminar minha casa. e estou curtindo meu último dia de férias de filhos. amanhã a vida doméstica volta à doce rotina, com meus filhos em casa.
enquanto estava esperando meu computador, que já é um senhor de idade avançada, fazer umas atualizações, fiquei olhando pro lustre de cristal maravilhoso da sala do meu apartamento e pensei em quantas comemorações eu DEIXEI de fazer. e em como agora eu faço celebrações diárias.
quando vim morar aqui eu pensava - não, eu não pensava, eu tinha certeza - que moraria aqui por um, no máximo dois meses. depois de morar aqui por dois anos, num apartamento emprestado, comprei o apartamento. e eu sempre pensava em dar festas: quando eu me mudar pra outro apartamento, quando eu pintar as paredes, quando eu reformar o banheiro e ali tiver uma banheira. quando não me mudei, pensava em dar uma festa "quando o apartamento estivesse pronto". mas nada fica pronto nunca. descontando as alquimias culinárias.
e hoje eu cheguei em casa feliz da vida, contente por estar trabalhando com pessoas doces, inteligentes, lindas e jovens. j-o-v-e-n-s. essa é a alegria de voltar pro mundo corporativo. eu sempre trabalho com um monte de pessoas jovens. e elas são uma alegria na vida de qualquer pessoa.
eu desconfiava disso quando era jovem, mas me relacionava com tanta gente escrota que dizia "você é jovem demais" que acabava ficando em dúvida. mas agora, com meus lindos e rebeldes cabelos brancos e minhas rugas na cara, sei que o que eu pensava quando tinha 15, 19 e 27 anos era verdade.
as minhas certezas hoje são relativas, graças a deus. e a falta de certezas dessas pessoas adoráveis que têm muitos anos menos do que eu me traz uma alegria gigantesca, quase irreal.
quando eu era jovem e trabalhava com pessoas mais velhas do que eu, ficava boquiaberta com a vida deles: posições mais elevadas do que eu na firrrrrma, mais dinheiro do que eu no banco, roupas caretas e a existência de cônjuges e filhos, o que pra mim era um cubo mágico. uma coisa que eu nunca conseguiria - e nunca consegui - montar. falo do cubo mágico, evidentemente.
mas voltando à vida 'das pessoas mais velhas', agora vejo vivo sinto e sei que consegui montar. a logística é outra, claro. porque não importa onde eu esteja, eu tenho de administrar onde meus filhos estão. a comida, o sono, o banho, as brincadeiras e os compromissos deles, meus pequenos herdeiros.
tento resolver da forma mais simples possível. meus filhos não vão ao clube toda tarde com a babá, e nem babá eles têm. não tenho dinheiro nem saco pra isso. quando me perguntam se meus filhos passam o dia todo na escola e eu digo que não, vejo pares de olhos arregalados me fitando. 'mas com quem eles ficam?'. com a empregada, ora bolas.
eu não fui criada assim. minha mãe administrava a vida dela e cuidava da gente, mas não 'trabalhava fora'. as aspas são usadas porque toda mãe trabalha, dentro ou fora de casa. mas trabalha. e duro. mas depois que meu filho nasceu e eu pude ser mãe full time por um ano, entendi que o trabalho existe dentro e fora de casa. e entendi também que eu queria ter os dois. e que precisava disso pra ser feliz, pra ganhar dinheiro, pra contar histórias sentada na cama do joão, pra dar gargalhadas muitas vezes por dia. e, óbvio, pra pagar as contas, porque nenhuma tinha milionária me deixou herança, infelizmente.
às vezes preciso de legendas pra entender algumas coisas que meus colegas que nasceram muitos anos antes de mim dizem. mas eles também precisam de legendas pra entender o que eu digo. mas isso não é ruim. isso é um tesão.
lágrimas teimosas encharcam meus olhos, e eu lembro de tanta gente rindo do que eu acreditava quando eu tinha vinte anos menos do que tenho hoje. eu não gosto disso. aliás, acho o supra-sumo (ou suprassumo?) da deselegância rir de alguém, a menos que a própria pessoa esteja rindo dela.
mas acho que tudo o que tô escrevendo me faz crer que eu acredito que a vida anda pra frente, pelamordedeus. e que estou tentando criar meus pequenos herdeiros desta forma: acreditando que ELES me ensinam e que ELES trazem verdades. e que todas as verdades, as minhas e as dos meus filhos, são relativas. e mudam duma hora pra outra.
pausa pra um cigarro, e pras lágrimas jorrarem bochechas abaixo.
a vida vai andando, e eu vou celebrando. ouvindo a trilha sonora de bagdad cafe, que é bem linda, estranha e, mais legal de tudo, alegre.
bagdad cafe? o que é isso?
ah ah ah.
ah, ia esquecendo. celebrando o que mesmo? tudo. o sol quente de hoje. o cinema de ontem. as lágrimas durante e depois do filme, à deriva - uma ode à vida, ao crescimento e à dor que tudo isso traz de presente pra gente. a cerveja preta gelada. e o som, agora abba, uma maravilha brega, linda e alegre, como esses meninos que eu encontro todo dia e com quem tenho cafés e almoços felizes.
deus esteja.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

quantos dias demora pra ter saudade?

a pergunta ficou piscando na dentro da minha cabeça no domingo. agora ela ainda pula, mas com menos intensidade.
depois de nove dias tendo "vida de solteira" na minha casa, comecei a sentir muita saudade dos meus filhos. só faltam 3 dias pra eles voltarem de "tubatuba", e eu fico fazendo contagem regressiva.
não consigo escrever agora, porque cheguei feito uma minhoca sonolenta ao trabalho um pouco antes das 7am. na lanchonete, muita gente tomando café da manhã. e, no estúdio, surpresa!, um jornal no ar. isso é engraçado de trabalhar em TV: nunca é muito cedo nem muito tarde. sempre tem gente trabalhando com cara de gente trabalhando, e não com cara de minhoca sonolenta, como eu.
esta é a sexta semana de férias escolares, e isso quer dizer que há seis semanas eu NÃO acordo às 5:30am. acordo duas ou três horas depois. mas hoje acordei no horário de sempre. e ai, socorro. muitos carros nas ruas às 6:30am, e eu com a sensação de que eu era a única que tava morrendo de sono.
ao trabalho.

sábado, 25 de julho de 2009

sobre as bobagens da blogosfera

eu me sinto até culpada. porque rir dos outros é uma coisa medonha. mas eis que estou trabalhando num projeto internético e tenho de ver vários sites. e eis que a rebeca, com quem trabalho e que também tem de ver vários sites, me passa esta pérola: http://uglyoutfitsnyc.com/.
é sobre gente que usa roupa feia. feia é pouco. é sobre gente que usa roupas horríveis, indescritíveis. eu vi todas as fotos do blog, e dei gargalhadas sonoras. segundo o meu irmão, coisa de mulherzinhas histéricas. fazer o quê?
e então hoje vesti meus herdeiros e me vesti para levá-los à casa do pai, onde partiriam pra praia. mas eu lembrei do blog e fiquei em dúvida se colocava minha adorável capa de chuva azul calcinha ou se brincava de gente decente e colocava um belo casaco de couro que uso duas vezes por ano. optei pelo segundo, já me achando uma ridícula.
desde sempre eu me visto muito mal. eu acho que no mundo dá pra dividir as pessoas em duas categorias, e não há meio-termo: existem os que se vestem bem e os que se vestem mal. eu nasci na segunda categoria, me esforço, tento me controlar, mas é mais forte do que eu.
vários fatores contribuem para eu viver atolada na segunda categoria, a dos mal vestidos. primeiro, acho um saco comprar roupa - experimentar já é tortura. segundo, não acho que seja um bom investimento enriquecer fabricantes de vestimentas. terceiro, me visto em um minuto. se demorar cinco minutos, é porque estou num dia surto e aí jogo sobre a minha cama uns dez cabides, mudo várias vezes as peças e saio de casa me achando o patinho feio. terceiro, tenho dificuldades em vestir roupas do meu tamanho. adoro uma calça gigantesca que sem sinto iria parar nos meus joelhos e blusas igualmente enormes. quarto, quando penso em conforto e beleza sempre, mas sempre mesmo, escolho conforto. e acho que nem sempre é possível conciliar os dois. quinto, nunca gostei de ser loira até ter uns 30 anos, que foi quando parei de pintar os cabelos de vermelho, de castanho escuro, de branco descolorido. sexto, e esse é o pior de todos, fico com vergonha quando escuto elogios. é bizarro, mas é verdade.
bom, agora acho que posso me levantar da cadeira e ir pro analista, mas ainda não acabei.
(pausa para checar o jantar. a quínua com inacreditável gosto de nada está cozida. daqui a pouco vou comê-la com muito azeite de oliva. e viva a dieta que não acaba nunca!)
há uns dois ou três anos, quando eu estava frilando na tv globo, uma repórter ultra mega gostosa me olhou na redação e disse: 'patricia, você não pode andar assim sem maquiagem'. e antes de terminar a frase, ela me sentou numa cadeira, abriu a necessaire dela com artigos de luxo lancôme, la prairie e quetais, e me maquiou. pedi pra ela pegar leve, porque eu ia no restaurante da tv almoçar e não queria parecer uma boneca emília. ela jurou que a maquiagem era leve. quando me olho no espelho, surpresa!, eu parecia a emília. minha cara branca e meus cílios beeeem pretos. mas não foi só isso. ela (a gostosa) disse que eram uma discrepância as minhas sobrancelhas, e que eu não podia usar as calças gigantescas que eu usava - na época, eu tinha me separado, sofrido e parado de comer, então estava pesando dez quilos a menos do que quando havia comprado as calças que eu usava.
pois bem, quando fui cortar o cabelo, resolvi fazer as sobrancelhas, pela primeira vez na vida. quase morri de dor, e ainda ouvi da florzinha que fazia o serviço que eu devia voltar lá a cada 30 dias. qua qua qua. pra uma pessoa que corta os cabelos duas vezes por ano, como é possível imaginar fazer a sobrancelha todo mês????
claro que nada mudou na minha vida, ou quase nada. agora eu faço a sobrancelha uma vez por ano. qua qua qua. oh my god, terei de publicar umas fotos mega incríveis aqui para não queimar meu filme.
enquanto escrevo vou dando gargalhadas, porque tudo isso é bem sinistro - tudo bem, eu ainda não fui na análise, e é claro que não é tão engraçado assim.
amanhã vou jogar sobre a minha cama t-u-d-o o que está dentro do meu armário pra dar uma geral, limpar, colocar um óleo de eucalipto num paninho, organizar a balbúrdia. e estou pensando que vou dar risada e vou doar 50% das minhas roupas.
dia desses, quando a costanza pascolato estava lançando um livro sobre a vida dela, li numa matéria dum jornal fuleiro gaúcho uma dica impressionante dela. considerando que ela é uma jackie o. da bananaland, fui lendo, atenta, mas não acreditei. a dica que ela dá pra uma pessoa saber escolher suas roupas é tirar fotos vestindo os modelitos, com diferentes enquadramentos (frente, perfil, costas), pra fazer um levantamento do que fica bem, do que fica ruim e do que fica péssimo. como eu nunca farei isso, me contentei com a ideia de que numa próxima vida eu talvez nasça com dons de mulher-insuportavelmente-chique, dom este que mrs. pascolato ganhou quando nasceu.
e isso me faz lembrar uma noite em que meu então marido lançou um livro na livraria cultura do shopping villa lobos. fui trabalhar bem linda, com um vestido maravilhoso da extinta viva vida e umas botas incríveis de uma loja caríssima do iguatemi cujo nome não me vem à cabeça, lenny, talvez. meu então marido adorava me dar presentes incríveis, e as botas eram um deles. mas coloquei por cima de tudo um jaco jeans da lee. tipo como-destruir-seu-look-bacana. estava eu perambulando pela livraria, entre os convidados do autor e meus convidados, uns 30 colegas de trabalho, quando me sento ao lado da tia betica. ela já era bem velhinha, devia ter perto de 90 anos, e nunca se casou. na família do meu ex-marido haviam apostas engraçadas sobre como deveria ter sido a vida dela quando era jovem. mas eis que a tia betica diz que eu estou muito bonita, e eu digo a ela que as botas maravilhosas de salto alto e o vestido de corte impecável eram uma exceção à regra. 'eu me visto muito mal, tia betica'. e ainda confidenciei que com pijamas a história era beeeeem mais dramática. contei que eu dormia com camisetas velhas do meu marido.
ela ficou horrorizada. me disse, em tom de alerta, que assim eu ia perder o marido. 'ele vai te trocar por outra.' e prosseguiu, dizendo que ela sempre usava salto alto, mesmo dentro de casa, porque senão o pé se acostuma ao conforto e nunca mais é possível usar um sapato de salto. essa história rendeu risadas no velório dela, uns anos depois, quando eu estava barriguda, grávida da minha filha. eu contei aos três sobrinhos dela, a rosa, o gonzaga e o guto. e a gente ria lembrando das ideias dela, que acho que nem são ideias de gente velha. são ideias de gente que acha que as roupas são importantes a ponto de colocar em risco um casamento.
depois escrevo sobre a sensacional arrumação de armário de amanhã. com fotos, i hope.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

pão, iogurte, manteiga

pão, iogurte, manteiga. pão, iogurte, manteiga. eu ia repetindo enquanto estendia a roupa hoje de manhã, pra não esquecer de escrever os itens na lista do supermercado que anda na minha bolsa há quase uma semana. e não paro de pensar no que significa as duplas (ou triplas) jornadas femininas de que tanto ouço falar mas que eu nunca tinha experimentado assim, de verdade e com exaustão.
o joão gabriel acordou cedo, foi pra minha cama e fungou durante uma hora. saí da cama às 7 e meia. pilhas de louça suja me deram bom dia quando cheguei à cozinha. e lá fui eu lavá-las, e jogar umas roupas na máquina. olho pro chão e vejo que a situação está crítica. varro tudo, e limpo a mesa, onde tinham passado a noite muitos e muitos farelos de pão do jantar das crianças.
o joão entra na cozinha e me convida para jogar canastra. ele vai pra sala arrumar as cartas, enquanto eu recolho a roupa seca do varal, dobro tudo, levo pro meu quarto, esquento água, coloco a mesa do café da manhã e faço chá e café. ele chega na cozinha e reclama: eu demorei tanto, diz ele, que ele já tinha pegado o morto. mas sem roubar, me garante, sem olhar nos meus olhos.
sento na mesa da sala e jogamos uma partida na qual ele fez muitas canastras e eu, nenhuma. a lívia acorda e vamos tomar café.
encho a banheira, convenço um de entrar no banho. depois convenço outro. limpos e vestidos, os sujeitos se sentam em frente à TV. penteio os cabelos dos dois, corto as unhas sob protestos, e vou tomar banho. quando me visto, não estou com calor, mas estou suando.
sei que são 10 horas quando toca a campainha. abro a porta e dou o lixo pro jailton, o faxineiro do prédio. vejo que ele veste uma blusa de lã e pergunto se está frio. ele diz que sim, que está muito frio.
morrendo de calor, escovo os dentes das crianças e peço que coloquem os agasalhos e sapatos. desligada a TV - depois de uma minúscula discussão, afinal são dois filhos e uma só TV, mas os dois querem desligá-la -, saímos de casa.
meu filho havia ligado pro pai dele cedo, pra perguntar se iriam pra praia hoje ou amanhã. o joão desliga o telefone e diz "não vamos pra praia. nem hoje, nem amanhã. a gabi está doente". bingo!
deixo as crianças na casa do pai e descubro que a madrasta deles está travada na cama. dores nas costas. ontem, que seria o dia de dormir na casa do pai, o próprio iria a uma festa. hoje, a mulher está doente. e amanhã, "não dá", me diz ele, meu ex-marido.
passadas quatro semanas de férias das crianças, estou exausta. passamos duas semanas no sul e duas semanas em são paulo. nessas duas últimas, eu levo as crianças pra casa do pai de manhã e busco no final da tarde.
o pão tinha acabado em casa. por isso, depois de deixá-los no pai hoje de manhã, fui ao supermercado. entrei de óculos escuros, chorando. de raiva e de solidão, acho. fui trabalhar e no trabalho cancelei com três amigas o nosso encontro de hoje à noite.
busco as crianças quando já é tarde pros parâmetros deles. hoje é meu rodízio e só saí da corporação às 8 da noite. eles já tomaram banho e "comeram na festa de aniversário da prima", me explica o pai deles. chegamos em casa e meu filho some. está na cama. escovo os dentes dele. minha filha quer tirar as compras que fiz de manhã e que passaram o dia no porta-malas do carro das sacolas. logo ela vai pra cama, e eu vou atrás escovar os dentes da guria.
então meu filho diz que está com fome. minha filha havia comido um pedaço de pão que ela tinha abandonado do café da manhã. digo pros dois que são quase 9 da noite e que não é hora de jantar. e a lívia pede água. levo um copo, que ela toma aos golinhos, bem devagar, até terminar tudo. enquanto eles dormem, penso no que sobra de mim para dar a eles a essa hora da noite. nada. ou quase nada.
mas tenho uma noite inteira de sono para amanhã acordar feliz e cansada e enchê-los de beijos, cheirar pescocinhos que têm o melhor cheiro do mundo e dizer muitas e muitas vezes que eu os amo.
e essa é a melhor parte da vida.