quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

mas será que eu estraguei tudo?

a apresentação era pra ser singela. sim, graças a deus meus filhos estudam numa escola onde as celebrações são singelas e cheias de significados. os pais foram entrando numa das classes, esbaforidos. eram 11am, e todos - acho - saímos correndo de onde estávamos para chegarmos e vermos nossos filhos tocarem kântele. é um instrumento musical que eu descrevo como uma pequena harpa. a partir dos 5 anos, os pequenos já conseguem passar seus dedinhos pelas sete cordas.
a professora de kântele entra na sala com sua trupe - os pais se apertam, junto a babás e empregadas, que nos dias de hoje já fazem parte das famílias e às vezes têm mais espaço que os próprios progenitores. os pequenos entram e o primeiro grupo começa a tocar. duas ou três musiquinhas, e o próximo grupo. o joão gabriel era do último grupo, terceiro, pelas minhas contas. mas ele disse "não vou tocar". shalimar, a professora de música, que mais parece um anjo do que um ser humano, e que largou o jornalismo para dar aula de música para crianças (!!!), mexe os ombros delicadamente, consentindo.
quando digo 'tudo bem' e o joão gabriel volta a sentar no meu colo, ele se anima e diz 'eu vou'. e vai. tocam uma musiquinha, duas, e de repente ele põe o kântele no colo, grita 'droga' ou 'porcaria' e pára de tocar. começa a chorar.
eu fico olhando, mais atônita do que aflita, pensando sim é claro que ele vai parar de chorar e vai voltar a tocar. mas ele não volta, e chora cada vez mais alto. a professora de classe dele - a de música continua regendo aquela minúscula orquestra - anda em direção ao grupo que se apresenta e pega meu filho no colo. acho que mais por imitação do que por iniciativa faço o mesmo, e ela me dá meu filho no colo. saio da sala. ele chora muito. e diz que quer terminar a apresentação.
volto com o sujeito no colo, me sento ao lado dele e espero ele voltar a tocar, mas ele não toca. ele chora e diz "minha última apresentação e eu não terminei". chora muito, soluça, e chora mais ainda.
palmas. o grupo dele termina. mais palmas. e ele chorando alto no meu colo, e t-o-d-o mundo nos olhando. por poucos segundos penso que estraguei tudo. que estraguei a apresentação das OUTRAS crianças, cujos pais não puderam ouvir nada do que tocavam.
meu filho continua a chorar muito, e umas lágrimas correm pelas minhas bochechas - uau, eu não sou insensível! vejo uma mãe que também chora, vejo cabeças que se viram para olhar aquela criança que soluça no meu colo.
uma amiga vem aquecer o coração do pequeno joão gabriel, a professora dele vem dar um beijo nele, e ele diz que "as palmas não foram pra ele, porque ele não conseguiu terminar de tocar".
e vamos dar tchau pra adorável shalimar, e vamos pra casa.
e eu só me dou conta de por que pensei que 'pudesse ter estragado tudo' quando contei pra duas pessoas como tinha sido a apresentação do meu filho na escola. duas mulheres, é verdade, cujos olhos costumam não se importar em ficar molhados, ou enxarcados.
as duas, que não se conhecem e que ouviram a história que acabo de contar em momentos distintos, repetiram a mesma pergunta, "como você aguentou? eu não posso ser mãe".
mãe nasce com o filho. por isso que o parto dói.
e criança chora com o corpo e com a alma, e por isso a gente não aguenta.

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