quinta-feira, 24 de junho de 2010

sobre os atrasos e o perdão

o dia ainda não era dia. estava aquela luz cinza, típica dos dias nublados, quando o sol ainda não apareceu. e eu dirigia pela rebouças e gritava feito louca dentro do carro.
a lívia ficou estava em silêncio, e o joão dizia que eu só reclamava, o que aumentava a minha fúria. quando finalmente chegamos à casa da roberta, onde eu deixaria as crianças, o joão tinha falado vários palavrões do grande repertório dele, e eu chorava.
deixei as crianças e voltei pra casa chorando no carro, dirigindo rapidamente para chegar em casa antes de ser multada, o que poderia acontecer depois das 7am.
arrumei minhas coisas para ir ao trabalho de ônibus, que é a rotina das quintas-feiras, dia do meu rodízio. tinha de carregar uma mochila com meu computador, mais a minha bolsa, onde entre outras coisas estava o meu almoço. hoje era o último dia de aula das crianças, e eu tinha pensado em buscá-los na escola. mas desisti do plano maluco porque não conseguiria trabalhar se fizesse isso.
e hoje é dia de são joão, que eu resolvi comemorar depois de 21 anos. o dia sempre era comemorado na casa da minha mãe, de onde saí aos 18 anos. e mesmo tendo sido casada com o joão e ter meu filho joão, nunca tinha dado importância à data. um bolo de fubá cheiroso fez parte das comemorações, e eu pendurei bandeirinhas feitas por mim uns anos atrás na sala e na cozinha da nossa casa.
quando as lágrimas pararam de jorrar, fiquei pensando em como tudo começou. sim, os acessos descontrol de mães sempre começam em algum momento. aí lembrei que minha filha dizia que não ia vestir nenhum agasalho para ir à escola. depois ela se superou, e disse que não iria à escola. eu estava na porta de casa, dizendo que estávamos atrasados, quando o meu filho foi procurar os tênis e buscar alguma coisa para levar à escola. crianças adoram levar coisas pra escola, mas só lembram de pegá-las quando estamos fechando a porta para sairmos.
busquei a não-culpa, mas era impossível. fiquei me achando uma idiota, incapaz de criar filhos com doçura e sem gritos.
mas deus é pai e passadas algumas horas do meu descontrol lembrei que sou gente e que não dá pra aguentar tudo na vida com doçura. sorry.
aí lembrei do perdão. na verdade, consegui mandar a culpa embora quando lembrei dele. sim, eu não sou perfeita. sim, meus filhos me enlouquecem. sim, eu sou gente. ponto.
...
e nesse dia chato que começou cinza, ficou ensolarado e terminou com a lua em forma de bola no céu, fui almoçar com uma amiga. um almoço que estava encantado. depois de mais de um mês de 'vamos almoçar?', hoje ela iria a uma reunião no meu trabalho. calculei o tempo que chegaria ao restaurante e claro, cheguei antes. sentei no banco de madeira na calçada, em frente ao restaurante, e fiquei esperando. e fiquei agradecendo o atraso dela. gente vestida com 'roupas da corporação' passavam na minha frente. mulheres bundudas em calças pretas, outras com roupas absurdamente justas, homens de gravata e muitos crachás pendurados em pescoços.
lembrei que os atrasos dos outros sempre me deixam feliz quando esqueço do que tenho que fazer. quando tenho tempo por causa dos atrasos, consigo não fazer nada. e isso é uma delícia. e com sol, é uma delícia vezes mil.
...
os motivos de celebração hoje vão além do dia de são joão. a partir de amanhã, e pelos próximos 34 dias, meu despertador não vai me mandar sair da cama às 5am. isso é que é luxo.
deus esteja.

Um comentário:

Anônimo disse...

Tita querida, que saudades de vc! fazia tempo que não lia seu blog, resolvi ler para matar um pouco a saudades. Fica tranquila! sofro desse descontrol e também tento me perdoar todas as vezes, é natural, somos humanos, estamos aqui para aprender. Sei que é uma mãe maravilhosa, carinhosa, guerreira. Saudades, Rafa