segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

ele disse que sou 'heroica e louca'

ele é casado e tem duas filhas. e apesar de fazer muito, mas muito mais do que a maioria dos pais consegue fazer com seus filhos, ele está longe de ser um cara que 'dá conta do recado' sozinho. ele tem uma mulher, que como todas as mulheres que têm filhos - e cuidam deles -, faz malabarismos do início ao fim dos dias.
pois ontem ele me contou como foram os dias em que ELE teve de fazer tudo. nas palavras dele, 'lavar a louça, cuidar das crianças e dar remedinhos pra minha mulher'. isso porque, por uns poucos dias, ELA teve de ser cuidada, e não pôde cuidar de ninguém. e então ele me saiu com esta pérola: 'fiquei pensando em ti, que é heroica e louca'. e me perguntou por que eu ainda não tinha me casado com o primeiro cara que aparecesse na minha vida.
eu dei gargalhadas. muitas. e achei bizarríssimos os comentários. meu irmão é um cara inteligentíssimo, com bom senso e, uau!, cosmopolita. um cara que já trabalhou com várias coisas até largar um emprego estável, em hotelaria, quando ele era funcionário público, pra ir atrás do que ele gostava. e foi fazer teatro. com quase 30 anos, começou uma faculdade, depois fez um mestrado e agora faz um doutorado. escreve peças maravilhosas, é um baita diretor, um puta ator. adora viajar, fala vários idiomas, é fluente em no mínimo três.
fiquei pensando nos homens em quem tropecei desde que me separei, e enquanto conversava com ele por esta esquisitice útil chamada skype, dava mais gargalhadas ainda. como eu poderia ser tão estúpida a ponto de casar com 'qualquer pessoa do sexo masculino' depois de ter casado duas vezes e ter sofrido com duas separações com as quais concordei?
como diz a sabedoria popular, nada como um dia atrás do outro. hoje dou risada de coisas que me fizeram emagrecer de tanto sofrer. e entre essas coisas estão os fins dos meus dois casamentos.
eu sempre fui uma idiota que acreditava em bobagens como 1- o amor é eterno, 2- dinheiro não tem anda a ver com casamento, 3- casamentos podem durar muitos anos se as duas pessoas envolvidas na empreitada se amarem. mas como os tombos maiores são os mais esclarecedores, nada como arruinar os castelinhos que eu havia construído na minha cabeça para não pensar em construir mais nenhum castelinho.
'heroica e louca.' as palavras ficaram na minha cabeça o dia todo, e as fichas foram caindo. eu sempre acho esquisito pessoas que permanecem casadas mesmo com indícios claros de infelicidade. mas, como dizia meu ex-marido logo após a separação, 'você não tem namorado então você não entende'. para ele, SE eu tivesse um namorado eu entenderia as patacoadas que ele fazia. como trocar os finais de semana das crianças porque ele tinha de ir ao teatro com a namorada. mas eu não tinha um namorado, ficava furiosa com as patacoadas e cá estou, feliz da vida, SEM o namorado. que, para ele, acho, seria sinônimo de 'estar feliz'.
mas que catzo!
são duas as lições que acho que esqueceram de incluir nas 'lições básicas para criar um filho'. pelo menos eu as aprendi sozinha, e são elementares para uma vida feliz. primeiro, que felicidade e alegria não têm nada a ver com casamento. e, segundo, que nunca, jamais, devemos depender do dinheiro de outra pessoa depois que fazemos 18 anos. tão simples e tão oculto.
mas voltando à 'heroica e louca', o paulo me conta que teve um piripaque nas costas - é um sintoma recorrente na vida dele, mas acho que ele nunca deu a devida atenção. lembro de uma vez em que ele andava de quatro, literalmente. ele não conseguia ficar de pé. mas desta vez foi lá longe, nos estados unidos, onde ele tá morando. assim que a mulher dele não precisou mais ser cuidada, a coluna dele fez crec. na sequência ele me mostra as bochechas dele, tomadas de algo que um dermatologista chamaria de dermatite, creio. umas manchas vermelhas que eu não conseguia ver direito pela imagem da câmera, thank god.
e ele continua: disse que ficava surpreso com o meu físico. o que eu traduziria livremente para 'como você pode ser livre de perebas e consegue andar e dirigir sem ficar quebrada?'.
se não fosse hilário, seria muito triste. óbvio. mas as fichinhas seguem caindo. tenho horror de dar uma de vítima. mas criar filhos sozinha é uma tarefa que só compreende quem já fez. e eu vou me lembrando das barbaridades que já ouvi de amigas e amigos sobre os relacionamentos que sobrevivem de migalhas. e me lembro também de quando EU conseguia viver casamentos com migalhas.
nada disso alivia a dureza. porque o meu lado B é grotesco, como o lado B de qualquer um. e mesmo eu fazendo piadas idiotas do tipo 'o terceiro marido vai ser perfeito' e 'eu sei fazer furos nas paredes', sou uma reincidente. casei duas vezes e ainda acho bom casar. mas só se for pra ficar inteira, e não pela metade.
quando eu era criança, minha mãe me contava que tal criança tinha 'o rosto triste' porque os pais eram separados. eu nunca tinha notado?, ela me perguntava. claro que não. até porque crianças nunca têm rosto triste por causa DISSO. a outra frase recorrente era que 'fulano e cicrano' ainda estão casados por causa das crianças. e toda vez que íamos a eventos em que o pai e a mãe de alguém eram separados, eu ouvia comentários estranhos quando voltava pra casa. que a namorada do cara era esquisita, que a mulher tinha um namorado e por isso não era uma mulher, digamos, respeitável. afe!
se eu tivesse acreditado nessas lendas, estaria em maus lençois. minha filha soube que eu e o pai dela havíamos sido casados há um ano. até então - aos 4 anos - ela não sabia disso. sabia que o pai tinha uma mulher, e ponto. e essa mulher não é a mãe dela. e, melhor de tudo, meus filhos são loucos pelo pai, pela gabi, a madrasta deles, e pela pequena helena, a meia-irmã.
e então me vem à cabeça outra frase célebre da minha infância/adolescência: 'o que os outros vão dizer?'. que outros? na minha família, os 'outros' eram uma instituição bem importante.
muitas décadas depois, traduzi 'os outros' por 'eu'. o que eu vou pensar? o que eu vou dizer? sim, eu. porque os outros são os outros e eles não pagam as minhas contas, não levam os meus filhos à escola nem ao dentista, não cozinham para os meus amigos que vêm jantar na minha casa nem fazem cafuné na minha cabeça antes de eu adormecer.
heroica, louca e sã. vou ligar pro paulo.

2 comentários:

Anônimo disse...

Tita, tua tá demais! Bateu um bolão! Esse precisa salvar pro futuro livro!
Bjs,
Dani

tita berton disse...

meu deus! fiquei emocionada, dani.