sábado, 3 de abril de 2010

a chuva , o parque e o pêlo do coelhinho

combinamos de nos encontrar cedo. minha amiga tinha me dito que eu podia chegar à casa da mãe dela lá pelas 9am. 'o noah acorda cedo', ela falou no telefone. 'welcome to real life', eu respondi. a vida com crianças não é a vida que planejamos, mas é a vida como ela é.
mas como dias nublados são mais lentos que os dias com sol, eram quase 11am e ainda estávamos em casa. ela ligou e disse que não iríamos almoçar na casa da mãe dela. já que chovia e não levaríamos as crianças pra piscina, podíamos almoçar num restaurante, para passear. 'meus pais e uns amigos do stewart vão almoçar com a gente'.
fomos. na rua da casa dos velhos da mona tinha feira. tentei dois caminhos, nenhum funcionou. liguei, ninguém atendeu. olhei no mapa, e fiz um terceiro caminho, até que chegamos. meus filhos já tinham encontrado a mona, o stewart e o pequeno noah um ano atrás. mas não se lembravam.
o noah é um pequeno garoto poliglota. fala português por causa da mãe, que é brasileira. fala inglês por causa do pai, que é inglês. e fala espanhol porque nasceu e mora na espanha, onde a babá também fala espanhol.
eu não lembrava da rotina de crianças de 2 anos. assim que chegamos, a mona disse que o noah ia tirar uma soneca. mona, stewart e o casal de amigos gringos iam tomar café da manhã. eles tinham ido correr no parque e tinham comido pouco. meus filhos, que adoram comer, se sentaram e mandaram ver.
após protestos, o noah tirou a soneca dele e pudemos conversar. quando ele acordou, partimos a pé até o restaurante, onde outro casal de amigos nos esperava. começou a chover, a mona sugeriu que fôssemos de carro, mas o joão gabriel protestou. muitos guarda-chuvas em punho, e lá fomos nós por dentro do ibirapuera rumo ao restaurante.
eu não pisava no mam - museu de arte moderna, acho - havia muitos anos. a mona havia me dito que o restaurante era muito bom. no percurso, o noah no carrinho coberto por uma capa de chuva para carrinhos, meus filhos correndo felizes pela chuva, e os adultos andando com guarda-chuvas.
no bufê, NENHUMA comida interessava aos meus filhos. olho pro lado, e vejo o prato do noah CHEIO de comida: tomate recheado com queijo, torta de queijo e muitas outras coisas deliciosas. morri de inveja e lembrei de quando o meu filho comia tudo. literalmente.
as crianças - as minhas - ganharam uma taça de sorvete com calda gigantesca, e eu enchi um prato com comidas deliciosas. passada menos de meia hora, meu filho diz que quer correr no parque porque está com frio.
saio com a lívia, o joão e o noah. um presente para os adultos que ficaram sentados, conversando, almoçando e tomando café.
nossa mesa era enorme e me pareceu ser a mais barulhenta de todas. o casal de amigos do stewart - ela, alemã, ele, americano, inconfundível, com camisa social, bermuda creme muita curta, meias e umas botas timberland -; o casal que nos esperava no restaurante, que tem uma ong numa favela paulistana - ela de moletom, camiseta e pochete, e ele numa cadeira de rodas motorizada por causa da esclerose múltipla (acho que foi isso que a mona me falou, mas não tenho certeza); eu com os meus filhos, que reclamavam o tempo todo que eu não estava falando na língua deles; e a mona e o stewart, dando conta de todos esses amigos, mais o pequeno noah, que comeu pouquíssimo do gigantesco prato de comida dele e queria brincar.
na hora de ir embora, chovia. a 'pouring rain', ou em portugês claro, uma puta chuva. o stewart disse que ia buscar o carro. o casal gringo iria ver a exposicão do mam. do casal da ong estava apenas o marido: o motorista viria buscá-lo depois de levar a mulher ao cabeleireiro.
aí a conversa ficou engraçada. os gringos foram pro museu, e nós ficamos esperando o stewart, para quem não podíamos ligar porque estava sem celular. o élvio pediu ajuda para colocar as pernar na cadeira, e meus filhos perguntavam insistentemente por que ele tinha pés tão grandes. na verdade, ele usa sapatos maiores que os pés, para caber algum aparelho que eu desconheço. um homem adorável, que só mexe uma mão, e com ela come, atende o celular e comanda sua cadeira motorizada. as crianças olhavam com olhos arregalados. e eu digo que ele tem uma cadeira para ajudá-lo a andar, já que suas pernas não conseguiam fazê-lo. e ele conta, às gargalhadas, que uma vez uma criança ouviu do pai que ele, élvio, não podia andar. e a criança disse 'ele anda, sim, com a cadeira'.
finalmente o stewart chega, e voltamos à casa da miriam e do isaac - que no fim não foram almoçar com gente, porque nosso almoço foi à tarde. o dia tinha terminado, e lá fora já estava escuro. mas as crianças não tinham almoçado. colocamos uns milhos para cozinhar. eles devoram as espigas.
eu estava exausta, e consigui dizer 'crianças, tamos indo'. arrumamos a zona que estava na sala, e damos beijos em todos.
estou quase saindo quando o stewart me diz que estou fazendo 'a great job' com os meus filhos. e me dá um abraço. tchau pra todos, um abraço apertado na mona, e quando estamos saindo o noah vira a mesa de vidro do centro da sala em cima dele. daqueles milagres que só acontecem com as crianças: ele se assustou, mas não se machucou. foram buscar gelo, e eu e as crianças saímos silenciosamente pela porta, pegamos o elevador e tomamos um banho de chuva até entrarmos no carro.
agora as crianças dormem, e os ovinhos do coelhinho estão escondidos. a lívia deixou uma cenoura pro coelho, em cima de um pratinho. a cenoura já está roída. antes de dormirem, a lívia achou 'um pêlo branco do coelhinho'. eu estava fazendo xixi, e vi o joão colocando chinelos e gritando 'a gente vai lá embaixo ver se o coelhinho está lá'. eu gritei 'não, ninguém vai descer', e a resposta foi simplesmente 'mãe, a gente não vai de elevador'.
um minuto depois os dois estavam de volta, bufando. não tinham achado o coelhinho. mas a lívia me disse que tinha a 'barriga do coelhinho' debaixo da minha cama. e como ela tinha ficado com medo, havia fechado a janela do meu quarto.
depois de um dia como este, tenho certeza de que nada é em vão. e vou pra cama feliz. e, antes de dormir, vou agradecer. pelos amigos que moram do outro lado do mar e que são como irmãos para mim.

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